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Juncker considera que a Ucrânia é demasiado “corrupta” para entrar na UE

O país é considerado um dos mais corruptos da Europa, segundo o ranking da Transparência Internacional. Ucranianos consideram mesmo que é um dos maiores problemas do país. Washington pressiona Kiev num momento em que a ajuda dos EUA ameaça tornar-se tema nas primárias republicanas.
8 Outubro 2023, 11h34

O antigo líder da Comissão Europeia criticou a possibilidade de a Ucrânia entrar na União Europeia (UE) por considerar que o país sofre bastante com a “corrupção”.

“Alguém que tenha lidado com a Ucrânia sabe que este é um país corrupto em todos os níveis da sociedade. Apesar dos seus esforços, não está preparado para a adesão, precisa de reformas internas massivas”, disse Jean-Claude Juncker em entrevista esta semana com o jornal alemão “Augsburger Allegemeine”, citado pelo “Politico”.

Fazer “falsas promessas” aos ucranianos sobre a adesão à UE “não seria bom nem para a Ucrânia nem para a UE”, acrescentou o ex-líder comunitário entre 2014 e 2019.

“Não devem fazer falsas promessas às pessoas na Ucrânia que já estão a sofrer bastante. Estou muito chateado com algumas pessoas na Europa que dizem aos ucranianos que podem tornar-se membros imediatamente”, afirmou.

A Ucrânia tem estado a tentar acelerar a sua adesão tanto à União Europeia como à NATO após o início da invasão russa em fevereiro de 2022.

Sobre os processos de adesão de países como a Ucrânia e a Moldávia, Juncker defende que devem ser acompanhadas por “reformas internas” e que sejam aprovadas por uma “maioria qualificada” na UE.
Apesar dos avisos de Juncker, o certo é que tanto a presidente da Comissão Europeia Ursula von der Leyen como o presidente do Conselho Europeu Charles Michel são favoráveis à adesão da Ucrânia.
Em dezembro, poderá haver um anúncio formal de abertura de negociações com a Ucrânia, segundo o “Politico”, que vive a invasão russa desde

Um relatório do Governo norte-americano divulgado em fevereiro deste ano pela “CNN” expôs as preocupações de Washington com a “percepção de corrupção ao alto nível” no país, o que pode vir a minar a “confiança dos ucranianos e dos líderes estrangeiros no Governo” ucraniano liderado por Volodymyr Zelensky.

A Estratégia Integrada para o País defende também que o ensino de inglês chegue a mais ucranianos, e que os militares do país adoptem os protocolos da NATO, segundo o documento citado pelo “Politico”, destacando que as partes mais duras do relatório ficaram guardadas para a versão confidencial.

O fim do domínio por oligarcas “em particular dos sectores da energia e mineiro, é essencial para construir uma Ucrânia melhor, segundo o documento, destacando que o Governo de Kiev apoia “reformas significativas na descentralização do controlo do sector da energia”.

No sector financeiro, o documento defende o “aumento de empréstimos para encorajar a expansão dos negócios”, defendendo também uma redução do papel do Estado na banca. Neste sentido, defende a privatização do Sense Bank, que era detido por russos, mas foi nacionalizado por Kiev.

Vários casos de corrupção têm sido revelados pelos meios ucranianos. A plataforma online Nashi Groshi expôs os contratos generosos do ministério da Defesa ucraniano: 46 cêntimos por ovos que deveriam custar cinco cêntimos, ou 86 dólares por casacos de inverno com o preço de 29 dólares, segundo o “New York Times”. Volodymyr Zelensky acabou por afastar o ministro da Defesa Oleksii Reznikov, que foi afetado pelo escândalo, apesar de não estar pessoalmente implicado.

Outra plataforma, a Bihus, expôs os carros e as férias de luxo de políticos desde a invasão. Um desses casos foi o de Aline Levchenko, mulher do deputado Bohdan Torokhty, que partilhou as suas férias de luxo na Europa e no Médio Oriente logo após o início da invasão pela Rússia, enquanto os seus compatriotas tentavam repelir o ataque russo. Ao mesmo tempo, foi contratada como conselheira para a Antonov, a fabricante estatal de aeronaves, apesar de não ter experiência no sector da aviação.

Noutra frente, milhares de ucranianos assinaram uma petição a pedir ao presidente Zelensky que aprovasse legislação para os políticos voltarem a apresentar as declarações de rendimentos, uma obrigação suspensa desde o início da invasão.

“As declarações de rendimentos ajudaram a expor a corrupção ao mais alto nível” e os legisladores querem “manter as fortunas de guerra em segredo para ficarem absolvidos de crimes”, segundo Vitalli Shabunin da ONG Centro de Ação Anti-Corrupção em Kiev, citado pelo “NYT).

Os ucranianos têm noção do que se passa à sua volta. A corrupção é considerado o segundo maior problema do país (89% dos inquiridos assim o disseram), apenas atrás da invasão, segundo um inquérito do USAID/ENGAGE. A corrupção dos políticos é considerada a mais séria (81% dos inquiridos).

A Ucrânia é considerado o segundo país mais corrupto da Europa, somente atrás da invasora Rússia, segundo o ranking da Transparência Internacional, que agrega vários estudos internacionais.

O documento destaca a suspensão dos partidos políticos de submeterem relatórios financeiros, entre outros, à avaliação da Agência Nacional de Prevenção de Corrupção (NACP). A falta de reformas no sector da justiça, assim como no Ministério Público e nas agências policiais também são consideradas uma ameaça à estabilidade dos órgãos anti-corrupção. Outro dos problemas são: nepotismo, as cunhas para arranjar empregos, o financiamento secreto de partidos, e ligações suspeitas entre o mundo dos negócios e os políticos.

A justiça na Ucrânia tem atuado. Um juiz do Supremo Tribunal foi preso em maio acusado de corrupção. Outro juiz em junho foi condenado a 10 anos de prisão por corrupção. Já o oligarca Ihor Kolomoisky foi preso em setembro dois anos depois de o Departamento de Justiça dos EUA ter acusado-o de desviar milhares de milhões de dólares de um banco privado ucraniano detido por si e lavado o dinheiro ao comprar imobiliário em várias cidades norte-americanas.

A partir de Washington aumenta a pressão sobre Kiev e Zelensky para a importância do combate à corrupção. Os EUA já contribuíram com 23 mil milhões de dólares para apoiar a Ucrânia, e não inclui os gastos militares.

“A mensagem para os ucranianos tem sido sempre, se alguns destes fundos forem desviados, isso coloca em risco o apoio dos EUA ao país”, disse recentemente um membro do Governo norte-americano à “CNN”.

A pressão sobre o apoio dos EUA à Ucrânia aumenta. Apesar do apoio de Joe Biden, alguns candidatos às primárias republicanas têm mostrado dúvidas sobre este apoio, incluindo Donald Trump.

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