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António Saraiva: “O Estado não pode mandar para as empresas custos que quer aligeirar da sua parte”

O presidente da CIP afirma ao Jornal Económico que “o mínimo” que exige é que, no âmbito do regime do lay-off, a suspensão dos contratos seja mantida a par da redução dos períodos normais de trabalho até ao final do mês de setembro.
  • Cristina Bernardo
4 Junho 2020, 07h40

A CIP tinha proposto prolongar o lay-off simplificado até ao final do ano, mas o Governo esclareceu ontem que deverá manter-se só para os negócios ainda fechados por imposições legais. Há margem para negociar?

Aquilo que a CIP e as outras confederações defendem era exatamente isso, a extensão até ao final do ano, do atual regime, sendo certo que estávamos – e estamos – disponíveis para pequenas adaptações desta ou daquela natureza, porque este regresso gradual e assimétrico à economia, o desconfinamento, leva a realidades diferentes, mas não tão diferentes que justifiquem, pura e simplesmente, que se abandone dando-lhe uma machadada letal a esta figura. Todos concordam que esta figura demonstrou que é ajustada ao grande objetivo com o qual foi lançada: salvar o mais possível e garantir postos de trabalho. Este é o grande objetivo que não podemos esquecer, que preside à figura do lay-off simplificado e, para mantermos a defesa dos postos de trabalho, ele deve-se manter, porque o desconfinamento está a ocorrer, mas a retoma não. Não estamos a retomar consumo como alguns, e nós, gostaríamos nas empresas: 15% do consumo perdemos com a perda de turistas e outro está a fazer-se muito lentamente. Não é o facto de se dar liberdade aos restaurantes de abrirem que lhes faz entrar os clientes porta dentro. Temos restaurantes abertos com zero clientes. As empresas continuam sem receitas. As empresas médias continuam sem encomendas. Os nossos exportadores perderam significativamente, porque 75% das nossas exportações destinam-se à Europa e os mercados europeus estão como sabemos. Admitíamos que, por essa retoma gradual, pudemos ir modelando algumas questões, mas não a perda da figura. Acabarem com a suspensão num momento em que as empresas continuam a necessitar, para salvarem postos de trabalho e irem modelando os seus recursos humanos ou trabalho, de acordo com as suas necessidades? Aquilo que nós solicitamos é que, pelo menos, a suspensão dos contratos seja mantida a par da redução dos períodos normais de trabalho. No mínimo isto, até ao final do mês de setembro.

Mas as confederações admitem que o regime de lay-off simplificado, mesmo nos moldes atuais, carece de “reajustamentos”, sobretudo ao nível do mínimo de rendimento garantido ao trabalhador. Que readaptações propõem?

Vou esperar pela proposta do Governo e depois pronunciamo-nos sobre ela. A concertação social é tripartida e o Governo, para dar alguma expressão à reivindicação da parte sindical, quer – e bem, em termos sociais, não discutimos isso – gradualmente aumentar o rendimento dos trabalhadores que, estando neste regime, perdem um terço do seu vencimento. Mas as empresas também perderam significativas receitas. Há algumas que perderam a totalidade das suas receitas. Todos estamos a passar sacrifícios. O Estado não pode mandar para as empresas custos que quer aligeirar da sua parte. É humano que se queira que os trabalhadores não percam tanto rendimento, mas isso tem de ser à medida que as empresas o possam fazer.

Caso o Governo estendesse o regime lay-off simplificado, considera que deveria aumentar o teto máximo de pagamento do salário? Defende algum regime pago a 100%?

Reconheço que não é fácil desenhar uma tabela, mas temos de atender a determinadas variáveis. Não vou sugerir esta ou aquela questão, porque isso compete ao Governo, de acordo com o que já nos ouviu e ouviu das partes. Cabe-lhes apresentar uma proposta e ainda não apresentou – apenas definiu por alto. Pelo menos, que esta nossa questão da suspensão a par da redução [horária] seja mantida e depois estamos disponíveis a ver as adaptações que possam ser feitas em função das possibilidades que as empresas tenham. Se as empresas que não tiveram perdas de receitas significativas, que têm apenas de ajustar o número de trabalhadores às encomendas e ou que até têm vindo a aumentar o volume de trabalho, possivelmente, há casos em que isso pode ser feito. Há empresas que podem seguramente fazê-lo. Não podemos cortar cegamente as coisas.

Em relação aos apoios para as outras empresas, estarão dependentes das quebras de faturação, segundo a ministra do Trabalho. Que percentagens seriam aceitáveis? Deveria existir algum tipo de exceções?

Estamos à espera que nos seja dada essa tabela. Ainda não temos. De facto, a senhora ministra deu exemplos, mas não concretizou. Os exemplos que deu levam-nos a ter esta posição, porque as alterações que nos anunciou em concertação social resultam nesta nossa apreensão e pedido. Cada setor é um setor, cada caso é um caso, por isso estamos disponíveis para avaliar as propostas que o Governo nos venha a dizer. Teremos de as apreciar. Não podem é impor, dizendo que isso foi discutido em concertação social quando, mais uma vez, como acontece com os salários mínimos, vêm impor uma determinada expressão. Temos de ver e pronunciar-nos-emos sobre isso. Felizmente, o lay-off simplificado permitiu que o desemprego não fosse nos números que se chegou a pensar que se iriam ter, mas as previsões de todas as entidades – União  Europeia, FMI, Banco de Portugal – dão um potencial de desemprego em Portugal de até 14%. Temos de evitar isso a todo o custo.

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