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“Conversas no Chiado”: crise no modelo de negócio dos media prejudica jornalismo de investigação

Na segunda edição do “Conversas no Chiado”, Eduardo Dâmaso Luís Rosa, Henrique Salinas e Rui Patrício discutiram a crise no modelo de negócio da comunicação social e o seu impacto na investigação a casos de corrupção.
5 Junho 2018, 10h45

Os quatro oradores presentes esta segunda-feira na conferência do ciclo “Conversas no Chiado”, promovida pelo Jornal Económico com o apoio da FNAC, concordaram todos com a ideia de que se está a assistir a uma crise no modelo de negócio da comunicação social e de que há menos jornalistas nas redações, nomeadamente devido a questões financeiras, o que está a prejudicar o jornalismo de investigação.

Partindo da premissa de que os casos de corrupção e de branqueamento de capitais têm ocupado cada vez mais espaço na agenda mediática nacional, os jornalistas Eduardo Dâmaso e Luís Rosa e os advogados Henrique Salinas e Rui Patrício sentaram-se lado a lado, no auditório da FNAC do Chiado, para discutir o papel da comunicação social na investigação a estes casos e a relação entre os media e a justiça, no cumprimento das respetivas missões.

Luís Rosa, redator principal do jornal online “Observador”, admite que não consegue “compreender a dificuldade que os advogados têm em entender a investigação jornalística”.

“Temos de defender o princípio do interesse público. Essa é a nossa missão, levar à opinião público um conjunto de factos que tenham relevância”, justificou. Envolvido em investigações sobre os casos ‘Face Oculta’, ‘Bragaparques’ ou ‘CTT’, o jornalista não vê o trabalho desenvolvido pelos profissionais da sua área “como justiça popular ou condenar os que estão na praça pública”. E acrescenta: “A divergência deve ser assinalada. O papel do jornalismo é muito diferente do da justiça e passa por escrutinar os titulares dos cargos públicos do poder executivo e judicial”.

No debate moderado pelo diretor d’O Jornal Económico, Filipe Alves, os oradores recordaram que o caso “Watergate”, apesar de ter tido uma investigação jornalística própria, nasceu de processos judiciais e partiu de um processo já existente. Eduardo Dâmaso remonta também à História para explicar o fenómeno e cita o exemplo de jornais que chegaram a ter cerca de 15 jornalistas exclusivamente dedicados à investigação. “Ainda hoje continuam a existir processos, como o da ‘Operação Marquês’, nos quais houve uns quantos jornais que escreveram coisas antes. E foram insultados por terem projetado a ideia de que houve um senhor que foi primeiro-ministro que vivia daquela forma”, refere.

O diretor da revista “Sábado” sublinha que não se sente “vinculado ao segredo de justiça”, mas sente-se ligado aos “princípios basilares da sua profissão”, e confessa, despreocupado, que se desloca cerca de 10 vezes ao tribunal por processos oriundos das funções que exerce. Dâmaso explica ainda que o processo do advogado e político Domingos Duarte Lima [no Tribunal do Rio de Janeiro, referente ao homicídio de Rosalina Ribeiro, em 2009] é um exemplo “interessantíssimo” para estudar estes temas, uma vez que nele se falou de perícias financeiras ou das primeiras offshores, por exemplo.

O responsável de Direito Penal da CCA Ontier, Henrique Salinas, lançou um apelo: “Os jornalistas não se devem deixar instrumentalizar pelo Ministério Público” [conceção que o jornalista Luís Rosa considera “errada”]. “O jornalismo segue finalidades próprias que não têm de ser as da justiça, e vice-versa. O jornalismo de investigação tem o seu caminho próprio (…). Quando o acesso é feito através de informações que estão em segredo de justiça (…) pode ter as suas consequências e alguns riscos. É uma escolha que tem de ser feita”, disse o sócio do escritório liderado por Domingos Cruz.

Por sua vez, Rui Patrício aclarou o conceito de “convergência”, quando questionado sobre de que forma o trabalho jornalístico converge com a investigação judicial e até que ponto foi decisivo para determinados casos virem a público. O sócio da Morais Leitão, Galvão Telles, Soares da Silva lembrou que há perspetivas diferentes: se estiverem a investigar as mesmas coisas, ao mesmo ritmo, ou se estiverem a investigar autonomamente. “Hoje em dia a investigação é mais uma investigação que decorre a lado com os processos e vai buscar informação aos mesmos (…) Acho que diminuiu alguma coisa no jornalismo de investigação nos últimos anos em termos das investigações que decorrem autonomamente”, argumentou o coordenador de uma das equipas de Contencioso da sociedade.

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