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“É urgente que comece a chegar dinheiro às empresas”, apela Câmara do Comércio da Angra do Heroísmo

A exportação pode ser um dos caminhos para as empresas resolverem problemas estruturais, como a descapitalização e a pouca liquidez, defende presidente da CCAH.
28 Novembro 2021, 14h00

O presidente da Câmara do Comércio de Angra do Heroísmo (CCAH), Marcos Couto, considera que a insularidade, apesar dos seus fatores limitativos, deve ser encarada como geradora de novas oportunidades, em áreas como o turismo sustentável e os produtos de alto valor acrescentado. Diz que ainda existe um “enorme caminho” a percorrer e riscos imediatos. Por isso, pede que se avance urgentemente com as verbas do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), para a recapitalização das empresas.

A CCAH está integrada num contexto de insularidade. Isto tem sido um fator limitativo do desenvolvimento das empresas? Que mecanismos é que têm utilizado para para dar a volta a este contexto?
A insularidade é, ao mesmo tempo, um fator limitador e de novas oportunidades. As maiores limitações advêm dos custos de transporte, algo que os sucessivos governos, no caso dos Açores, nunca souberam/conseguiram ou quiseram resolver e que acarreta custos extra para as empresas e para quem habita nas Ilhas. Este fator nos Açores tem um peso acrescido dado o facto de sermos um arquipélago constituído por nove ilhas, com a descontinuidade territorial que lhe está associada. Muitas das nossas ilhas sofrem de uma dupla insularidade que é muito penalizadora. Exportar, a partir de oito das nove ilhas dos Açores é caro e imprevisível. Tudo o que uma empresa ou investidor não admite quando pensa em investir. Por outro lado, temos a dimensão territorial das nossas ilhas, onde o bem mais precioso é a terra, por ser escassa. Isso leva a uma agricultura e economia de subsistência que limita o crescimento económico. É difícil termos negócios de escala.
Por muito contraditório que possa parecer, esta realidade é ela própria fonte de riqueza e de oportunidades, isto se a olharmos na perspetiva do turismo sustentável, como é o caso dos nómadas digitais, e dos produtos de grande valor acrescentado. Nestes capítulos, diria que temos um enorme caminho a percorrer. Quanto ao primeiro tema, o turismo, preocupa-me o caminho que a maior Ilha dos Açores [São Miguel] e indiscutivelmente uma das mais belas dos Açores, está a trilhar. Não creio que devamos ser a “Grécia” ou mais um “Algarve”, estou muito mais alinhado com uma visão como a da Islândia, ou da Nova Zelândia, ou, se olharmos para o nosso país, o que está a ser feito no norte. O caminho que estamos a seguir é muito alinhado com uma perspetiva sul europeia e latina, que me preocupa profundamente. O nosso caminho deve ser a do turismo de qualidade, diferenciador, integrado, baseado nas pequenas unidades de charme e de grande qualidade, com uma forte presença da natureza. Este deve ser o nosso core business.
Quanto aos produtos de valor acrescentado, temos que olhar para o nosso clima como uma enorme mais valia. Temos chuva distribuída ao longo de todo o ano, o que devidamente aproveitado, pode baixar os custos de produção em diversas áreas da agricultura. Devemos procurar novos mercados alvo como as indústria cosmética e farmacêutica. Nada disto está feito e começamos agora a dar os primeiros passos. Temos um tecido empresarial que só agora começa a estar desperto para estas realidades.
O nosso papel, como câmara de comércio, é proporcionar esse desenvolvimento promovendo contactos e dando ideias, o que já estamos a fazero. O caminho é indiscutivelmente a exportação, com recurso a tecnologia de ponta e parcerias entre as empresas e a academia. Temos tudo o que precisamos, falta apenas o mais difícil: mudar mentalidades. É nisto que estamos a trabalhar. O turismo é importante para a economia dos Açores, mas não pode ser a única opção, ou a solução para todos os problemas. A pandemia mostrou-nos isso de forma clara. Espero que tenhamos aprendido a lição.

 

Estamos numa fase em que se prepara a retoma económica e empresarial. Os vossos associados têm as ferramentas necessárias e adequadas para tirar proveito desta onda?
A economia dos Açores é débil e vem de uma fase em que o Governo se substituía às empresas e à iniciativa privada em quase tudo. Foi criada a mentalidade da subsidiodependência. O Governo era o maior competidor das empresas no mercado de trabalho. Do ponto de vista social, lideramos o nosso país e, como tal, a Europa nos indicadores de pobreza da OCDE. O maior objetivo de muita da nossa população é trabalhar para o Governo ou viver de um qualquer subsídio. Esta mentalidade vai mudando com o novo Governo, mas temos um longo caminho de “desmame” a percorrer.
A riqueza não é gerada pelo Governo e isso é algo que os açorianos, e os portugueses em geral, ainda não entenderam. As empresas são, neste momento, as maiores “vítimas” desta realidade, lidando com uma enorme falta de mão de obra, que se encontra, muita dela, disponível, mas parada ao abrigo de alguns programas ocupacionais. O tecido empresarial, mesmo com os problemas estruturais que apresenta, tem feito um esforço louvável na dinamização da economia. Os apoios previstos para a recuperação económica, PRR e programa “Retomar” com o apoio do Banco de Fomento, são essenciais para dotarmos as empresas de mais “músculo” financeiro para enfrentar o futuro. É uma fase crucial e que determinará o nosso futuro, mas que estou certo os empresários açorianos saberão ultrapassar.

 

O fim dos apoios e um possível atraso dos fundos europeus
são um risco ?
A situação empresarial dos Açores, em nosso entender, é preocupante. Temos um tecido empresarial descapitalizado e com pouca liquidez, fruto da pandemia. Diria que a pandemia veio agravar e colocar a nu uma realidade que todos sabíamos que existia. As empresas dos Açores sempre tiveram problemas de capital, com baixos índices de autonomia financeira. A tempestade perfeita poderá acontecer com o fim das moratórias, associada ao atraso da chegada dos apoios às empresas, ao que adicionamos o inverno e a época baixa do turismo na região. Assim, diria que é urgente que se avance com a vertente do PRR que tem como objetivo a recapitalização das empresas, ao mesmo tempo que o Governo deve avançar já com o pagamento das primeiras prestações do programa de apoio à manutenção de emprego, mesmo antes das datas previstas, de forma a que esta medida ajude na liquidez das empresas, proporcionando a manutenção dos níveis de emprego. Se nada disto acontecer, temo por muitos postos de trabalho, já que o turismo é ainda muito sazonal, mesmo nas ilhas onde tem maior expressão. Diria que é urgente que comece a chegar dinheiro às empresas, o que ainda não aconteceu. O dinheiro das linhas de crédito COVID, em muitas situações, começa a chegar ao fim, já que foi utilizado para manter empregos.

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