[weglot_switcher]

Paulo Gonçalves Marcos: “Não admira que sejamos o segundo pior país da Europa a remunerar depósitos”

O Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários celebra 40 anos e reúne esta segunda-feira os melhores especialistas para debater os desafios do sindicalismo moderno num contexto laboral que está a sofrer mudanças profundas.
5 Junho 2023, 08h15

Os desafios do sindicalismo moderno serão debatidos na primeira grande conferência do sindicalismo moderno, que vai ter lugar na próxima segunda feira, dia 5 de junho, no seu Centro de Informação Urbana de Lisboa, a partir das 14h30. Este é um evento que conta com a presença de especialistas nacionais e internacionais. Marca também os 40 anos do Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários.

Paulo Gonçalves Marques, presidente da direção deste sindicato, mas também do Conselho Diretivo da União de Sindicatos Independentes, antecipa, em entrevista ao JE, o que será debatido nesta conferência.

Este será um debate sobre sindicalismo integrado na celebração dos 40 anos do Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários.

O pretexto imediato é a celebração dos 40 anos do Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários, o maior sindicato português e entre os grandes sindicatos, o único sem filiação ou sem afinidade político partidária. Este é também um triunfo da sociedade civil e de um grupo de pioneiros que há 40 anos ousaram ir contra o duopólio sindical que existia e é contra o alinhamento sindical com os partidos então dominante. Isto é uma pedrada no charco e comemoramos esses 40 anos de coragem e de resistência. Depois, também é o reflexo da sociedade em que nos mexemos. Hoje em dia, 85% a 90% dos sindicatos em Portugal são de matriz independente e não têm também afinidade partidária e por vezes de opinião publicada. Talvez a opinião publicada dê a entender que só existem duas realidades sindicais, duas centrais sindicais e dois tipos de sindicalismo o sindicalismo puro de protesto e o sindicalismo puro de acomodação. Nesta conferência, vamos procurar também trazer experiências da Europa em temas como a digitalização ou centralidade e igualdade de género. São temas muito importantes e ainda estamos um pouco nos antípodas daquilo que são as novas realidades. Vamos procurar refletir sobre o Estado Social que ainda não está totalmente realizado e as lacunas na agenda do trabalho digno.

Com que oradores irá contar esta conferência?

Vamos ter Jorge Aranda Bernal, presidente da Associação de Quadros da Banca em Espanha, oriundo de Bilbao Vizcaya, que tem hoje uma presença institucional e é um enorme sindicato, uma grande federação de quadros de origem no setor financeiro e onde a contratação coletiva, os expedientes, regulação do emprego e a dinamização supletiva é bastante diferente de outras realidades. Trazemos Maxime Legrand, presidente da Confederação Europeia dos Quadros e da Federação Europeia dos Quadros da Instituições de Crédito. Mafalda Troncho, diretora da Organização Internacional do Trabalho em Portugal, também vai marcar presença nesta iniciativa.

O que está por conquistar entre os trabalhadores do sector financeiro em Portugal?

Em Portugal há uma estagnação em termos reais dos salários e olhamos para a vizinha Espanha e é diferente. Este ano, no setor financeiro, os trabalhadores perderam em média 3,6% da remuneração real. Em Espanha, neste sector, temos as mesmas empresas, os mesmos bancos mas com um enquadramento institucional diferente e por isso há uma melhor distribuição dos rendimentos em Portugal.

A agenda do trabalho digno também vai merecer reflexão entre as novas tendências do mercado laboral.

Vamos abordar as novas realidades que estão a marcar esta década não esquecendo a descarbonização e a igualdade de género assim como a sustentabilidade. Infelizmente, em Portugal ainda não chegámos a esta discussão porque estamos quase num nível de sobrevivência na discussão de questões como a precariedade e de que como é que vamos avançar a agenda de trabalho para que ela seja verdadeiramente de trabalho digna e que não seja apenas um chavão. Assim, vamos trazer para debate aquilo que se está a discutir nas economias do centro da Europa e como é que sindicatos, entidades patronais e Governo trabalham em conjunto para fazer progredir uma agenda.

Já abordou aí a agenda do trabalho digno. Como é que perspetiva que possa ser a aplicação desta agenda especificamente no sector da banca?

Estamos bastante otimistas. Consideramos que foram dados passos muito importantes em certos sectores mas é claramente preciso reforçar o papel institucional dos mecanismos de prevenção de conflitos laborais e de e de promoção de direito de contratação coletiva.

Um dos maiores desafios que é colocado à banca, sobretudo no contexto nacional, mas também de certa forma europeu, tem a ver com o enorme pressão para que haja uma consolidação no sector. Teme que o avançar desta consolidação possa levar a mais despedimentos na banca?

O governador do Banco de Portugal diz que os bancos devem pagar mais pelos depósitos e na semana anterior, diz que há espaço para concentrar. No mercado português, os cinco maiores grupos bancários dominam entre 85% a 92% dos depósitos, do mercado do crédito, do mercado do sistema de pagamento. Não admira que sejamos o segundo pior país da Europa a remunerar depósitos e sejamos um dos países da Europa onde as taxas de intermediação são mais altas. Isto deixa-nos com imensa estupefação, sabendo que as economias de escala estão resolvidas numa escala de 50 mil milhões de ativos. Incentivar a concentração e aumentar o poder de mercado dos operadores, nomeadamente onde os operadores tendem a ser estrangeiros. Algumas das altas instituições portuguesas apelam à concentração para que o capital estrangeiro promova maiores margens de intermediação em desfavor dos agentes económicos portugueses e das famílias. Se calhar, devíamos estar a olhar para o que se faz no centro da Europa, onde bancos mais pequenos, comunais, têm um papel importante e financiam a economia.

Em Portugal, os cinco maiores bancos apresentaram resultados recorde neste primeiro trimestre: 954,3 milhões de euros, uma subida praticamente de 55% face ao mesmo período do ano anterior. Com estes resultados e com a banca a ganhar finalmente a alguma rentabilidade, como é que isto se vai repercutir nos salários dos funcionários do sector?

Essa é a questão do milhão. Apesar do que afirma, a realidade dos bancos é muito mais baixa do que muitos outros sectores como o turismo, telecomunicações, distribuição e retalho. É sinal de que as empresas são bem geridas e que estão saudáveis. No entanto, estas margens já permitem remunerar de forma adequada e acabam-se os pretextos para não remunerar de forma adequada os trabalhadores.

RELACIONADO
Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.