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Setor automóvel enfrenta recessão mundial em 2020

Associações que representam as marcas automóveis consideram que esta crise será mais grave do que a de 2009, enquanto as análises dos economistas são unânimes em considerar que o mundo será confrontado com uma recessão durante este ano.
11 Abril 2020, 21h00

O barómetro mundial do setor automóvel é o mercado dos Estados Unidos, onde, de fevereiro para março, as vendas de automóveis caíram de 16,8 milhões de unidades para 11,4 milhões, embora a queda ainda não tivesse refletido com total intensidade o efeito negativo da pandemia da Covid-19, nem o confinamento das populações atualmente praticado nas maiores cidades da generalidade dos Estados norte-americanos. Mas as previsões macroeconómicas avançadas para 2020 já permitem uma noção do efeito que a crise da Covid-19 vai provocar no setor automóvel, antecipando, segundo o UniCredit Research, uma queda de 10,8% no Produto Interno Bruto (PIB) dos Estados Unidos. A mesma análise aponta para quedas de 10% na Alemanha, de 10,5% no Reino Unido e de 7,5% no Japão.

Todas as administrações dos grupos automóveis alemães – onde se contam os principais líderes tecnológicos do setor, desde o gigante Volkswagen, passando pela mais formal Daimler-Benz e pela ágil BMW, até à popular Opel (agora integrada no grupo francês PSA), ou à tecnológica Porsche (que mantém grande ligação familiar e histórica à VW) – não ignoram o que foram os efeitos devastadores da crise de 2008 entre os “Três Grandes” de Detroit, a General Motors, a Chrysler e a Ford.

Nessa crise, Detroit ficou com os principais edifícios emparedados, a esmagadora maioria das empresas locais fecharam, milhares de famílias rumaram a outras partes dos Estados Unidos e as ruas da cidade passaram a ser policiadas por unidades do exército norte-americano.

Contudo, apesar da dureza dessa crise, as administrações dos três gigantes automóveis continuaram a funcionar em Detroit, onde têm as sedes, numa cidade – que foi a capital industrial dos Estados Unidos – então quase sem habitantes, com ruas sem movimento.

Além das quedas de vendas de veículos registadas em março, no setor automóvel ainda ninguém consegue quantificar a duração e a amplitude da atual crise, pois ninguém prevê a data de regresso do mercado ao funcionamento normal, que ocorrerá algum tempo após as fábricas terem retomado a sua laboração (a reabertura das fábricas na Europa está prevista para entre meados de abril e as primeiras semanas de maio, com novas regras de distanciamento entre trabalhadores).

Na Europa, no conjunto das vendas efetuadas em março nos mercados da Alemanha, Espanha, França, Itália e Reino Unido foram transacionados 599.550 veículos ligeiros de passageiros, o que corresponde a menos 750.491 veículos que os registados nas vendas de março de 2019, numa queda homóloga de 55,59%.

Em Itália, a redução homóloga de vendas em março foi de 85,4%, o que levou o presidente da associação dos fabricantes italianos (Anfia), Paolo Scudieri, a reconhecer que o setor se encontra numa “situação sem precedentes”. Num mercado dinâmico como o francês, que vendia anualmente entre 1,7 e 1,8 milhões de veículos, a queda de vendas registada em março foi da ordem dos 72,25% em termos homólogos.

Em Espanha, a queda homóloga em março foi de 69,48%. No Reino Unido, as vendas homólogas baixaram 44,4%, e na Alemanha a redução foi da ordem dos 37,7% no mesmo mês.

Entre as previsões macroeconómicas mais conservadoras encontra-se tradicionalmente a Economist Intelligence Unit (EIU), que agora também projeta uma recessão de 2,5% para a economia mundial, o que corresponde a “uma contração ainda mais profunda do que na crise financeira global de 2008”, refere no seu último relatório, contrastando assim com a sua anterior previsão, que apontava para um crescimento de 2,3% na economia mundial. A retoma na produção mundial será, segundo a EIU, “modesta”, e ocorrerá na segunda metade de 2020 se a Covid-19 for “largamente contida a nível global”, e no pressuposto de que “não há segundas ou terceiras vagas da pandemia”. Mas sublinha que “o impacto na confiança será duradouro”. Para o segundo trimestre de 2020, a EIU prevê que a Alemanha, França e Itália registem contrações económicas de 10% e o Reino Unido de 9,3%. Nos Estados Unidos, a EIU considera que a contração será de 5,9% no segundo trimestre.

Autoeuropa retoma no dia 20
Neste enquadramento, um pequeno país europeu como Portugal, que tem entre os seus maiores exportadores a indústria de componentes automóveis, registou uma queda de vendas em março de 56,6%, mas o secretário-geral da Associação Automóvel de Portugal (ACAP), Hélder Pedro, admite que a redução das vendas poderá atingir os 80% nos próximos meses – o Governo suspendeu as vendas de automóveis até 17 de abril.

“Esta crise terá um impacto em todo o setor e previsivelmente será mais grave que a crise de 2009 e 2010”, referiu ao Jornal Económico Hélder Pedro. “Também não há previsões de quanto tempo será necessário decorrer até ao mercado conseguir recuperar”, diz, considerando que “há projetos que poderão demorar mais tempo até se efetivarem”. Quanto à situação da Alemanha, o responsável da ACAP considera que “a indústria alemã dispõe dos meios que lhe são proporcionados pelo Estado alemão, por isso são capazes de alavancar grandes projetos, salvaguardando muitas partes envolvidas, designadamente, a manutenção de postos de trabalho”.

Entre os projetos em curso no setor encontra-se a fusão entre os grupos francês PSA e italo-americano FCA – Fiat Chrysler Automobiles, liderada pelo presidente da PSA, o português Carlos Tavares. O cronograma deste processo envolve entre 12 a 14 meses, desconhecendo-se ainda se será necessário ajustar a timeline. Do lado da FCA, na Europa tem as marcas Fiat, Alfa Romeo, Jeep e Abarth, enquanto nos Estados Unidos tem as marcas Chrysler, RAM e Dodge. Entre o grupo Fiat, fonte da empresa referiram ao JE que se mantêm as previsões de reabertura das fábricas ainda em abril. Este grupo vai concentrar as atenções na produção da versão elétrica do citadino 500, no desenvolvimento dos Jeep Renegade e Compass nas versões híbridas PHEV, no “ultradesportivo” Giulia GTA e no novo Wrangler híbrido PHEV.

A fábrica da AutoEuropa, do grupo Volkswagen, segundo anunciou a sua Comissão de Trabalhadores (CT), vai retomar a laboração, de forma gradual, a partir de 20 de abril, em horários reduzidos e sem turno da noite, a funcionar de segunda a sexta feira, sob aplicação do regime de lay-off simplificado, prevendo restabelecer o horário consagrado no Acordo de Empresa de 2019, a partir da semana 23, que é a primeira semana do mês de junho. A CT solicitou que a empresa garantisse a totalidade da retribuição mensal a todos os trabalhadores sob aplicação das medidas do lay-off simplificado, pagando o remanescente dos dois terços da retribuição.

Entre outras marcas que devem retomar a laboração das suas fábricas encontram-se a britânica Aston Martin, que deverá voltar à produção a 20 de abril e as unidades do Grupo BMW, da Mini e da Rolls-Royce que encerraram até 19 de abril, bem como a Nedcar, na Holanda, que fabrica modelos da Mini e da BMW. Por seu lado, a Daimler pretende reabrir as fábricas da Mercedes-Benz na Alemanha entre os dias 20 e 22 de abril.

Artigo publicado no Jornal Económico de 09-04-2020. Para ler a edição completa, aqui ao JE Leitor

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