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Primeiro-ministro reúne-se hoje com bastonário da Ordem dos Médicos depois de declarações polémicas

António Costa e Miguel Guimarães vão reunir depois de o primeiro-ministro ter criticado a auditoria realizada pela Ordem dos Médicos ao surto de Covid-19 num lar de Reguengos de Monsaraz.
  • António Costa
25 Agosto 2020, 07h40

O primeiro-ministro reúne-se esta terça-feira com o bastonário da Ordem dos Médicos depois das declarações polémicas feitas por António Costa sobre a atuação dos médicos no surto num lar de idosos em Reguengos de Monsaraz, onde um surto de Covid-19 provocou 18 vítimas mortais.

A reunião entre António Costa e Miguel Guimarães vai ter lugar esta terça-feira de manhã depois de dias de tensão elevada entre o Governo e a Ordem dos Médicos.

No domingo, foi revelada nas redes sociais um vídeo onde o primeiro-ministro criticava a atuação dos médicos no lar de idosos de Reguengos de Monsaraz. “É que o presidente da ARS [Autoridade Regional de Saúde] mandou para lá os médicos fazer o que lhes competia e os gajos, cobardes, não fizeram”, segundo disse António Costa na gravação feita pelo “Expresso” à margem da entrevista realizada pelo jornal e publicada no sábado passado.

Este vídeo contém uma conversa privada (em off the record) entre os jornalistas do “Expresso” e o primeiro-ministro e foi divulgado sem a autorização do semanário, conforme esclareceu o jornal na segunda-feira.

Por sua vez, o bastonário da Ordem dos Médicos veio a público criticar as declarações do primeiro-ministro. “As declarações foram infelizes. Ofenderam os médicos, que se sentem indignados com esta situação”, disse Miguel Guimarães na segunda-feira.

“A ideia do pedido de reunião ao senhor primeiro-ministro para conversarmos sobre esta matéria é explicar porque é que fizemos auditoria. No fundo, que ele possa ouvir o que nós pensamos”, destacou.

O bastonário disse que a auditoria realizada pela Ordem dos Médicos “não foi feita para condenar ninguém. A auditoria foi feita para cuidados que tinham sido ou não prestados, às normas da DGS que tinham ou não cumpridas, porque teve um impacto muito grande nas pessoas que la estavam, os idosos que são as pessoas mais frágeis, com um numero de mortes elevada, e o objetivo final da auditoria para saber se há ou não responsabilidades das pessoas envolvidas nesta questão do lar de Reguengos de Monsaraz, mas sobretudo para que esta situação não se repita noutras instituições com lares e esse é o objetivo fundamental”.

Cruzamento de críticas

O surto de Covid-19 num lar de idosos da Fundação Maria Inácia Vogado Perdigão Silva (FMIVPS) em Reguengos de Monsaraz, no distrito de Évora, provocou um total de 18 vítimas mortais.

A OM concluiu na sua auditoria que houve “falta de condições no lar e no pavilhão para onde mais tarde foram transferidos os doentes”, segundo um comunicado publicado na segunda-feira, onde garantiu que os “médicos de família nunca se recusaram a colaborar e continuaram a cuidar e tratar dos idosos doentes, estando o seu trabalho devidamente documentado. Apesar das ignóbeis pressões e ameaças, os médicos não abdicaram de continuar o seu trabalho de cuidar dos doentes nem do dever de denúncia perante as graves insuficiências verificadas no terreno”, segundo a Ordem dos Médicos.

A auditoria da Ordem dos Médicos às mortes no lar de Reguengos de Monsaraz levantou muita polémica depois da ministra da Segurança Social, Ana Mendes Godinho, ter dito que não tinha lido o relatório.

Já o primeiro-ministro criticou a Ordem dos Médicos por ter realizado a auditoria, considerando que não está na esfera das suas competências. “As ordens profissionais existem para regular o exercício da atividade dos seus profissionais, ponto. Não existem para fiscalizar o Estado”, disse António Costa em entrevista ao “Expresso” neste sábado.

Sobre estas críticas, a Ordem dos Médicos disse na segunda-feira que o seu estatuto “contempla um Conselho Nacional para a Auditoria e Qualidade com competência para realizar auditorias da qualidade no território nacional, como foi o caso da auditoria aos cuidados clínicos prestados aos utentes do Lar da Fundação Maria Inácia Vogado Perdigão Silva (FMIVPS), em Reguengos de Monsaraz, uma instituição privada”.

A OM também salientou que a necessidade de realizar esta auditoria surgiu depois de “várias queixas, alertas e intervenções por parte da sub-região de Évora da OM, do Conselho Regional do Sul e do bastonário, sobre a falência do cumprimento das normas emitidas pela DGS na prestação de cuidados de saúde aos idosos do Lar da FMIVPS, que foram ignoradas pelas autoridades competentes”.

Rui Rio defende divulgação de relatório enviado para o Ministério Público

Já na segunda-feira, o líder do PSD defendeu que o Governo devia divulgar o relatório da Segurança Social enviado para o Ministério Público a 16 de julho.

“O Governo tem dito que há um relatório oficial que até foi mandado para o Ministério Público. A minha pergunta é: mas não se pode saber o que diz o relatório oficial? Temos de continuar nesta confusão, com uns a responsabilizarem os outros, sem sabermos exatamente o que aconteceu?”, questionou hoje Rui Rio.

“Não percebo porque é que não é dado conhecimento publico do que é esse relatório oficial e do da Ordem dos Médicos, embora sobre esse já lemos um ou outro aspeto”, disse o líder do PSD esta segunda-feira.

Mas que relatório é este? Este documento foi elaborado pela Segurança Social e foi enviado para o Ministério Público a 16 de julho, segundo disse o primeiro-ministro na entrevista ao Expresso no sábado, 22 de agosto.

“No dia 12 de julho mandou abrir um inquérito; recebeu-o no dia 14 e no dia 16 comunicou ao Ministério Público. Não vou falar do inquérito, porque, tendo o MP aberto um inquérito, está neste momento sob segredo de justiça. Aguardemos serenamente para ver se tem relevância criminal”, disse António Costa ao Expresso.

“Se [a ministra da Segurança Social] participou ao MP (…) era para investigar se havia alguma responsabilidade criminal”, segundo o primeiro-ministro.

Este relatório é diferente do elaborado pela Ordem dos Médicos que concluiu na sua auditoria que houve “falta de condições no lar e no pavilhão para onde mais tarde foram transferidos os doentes”, segundo um comunicado publicado na segunda-feira, onde garantiu que os “médicos de família nunca se recusaram a colaborar e continuaram a cuidar e tratar dos idosos doentes, estando o seu trabalho devidamente documentado. Apesar das ignóbeis pressões e ameaças, os médicos não abdicaram de continuar o seu trabalho de cuidar dos doentes nem do dever de denúncia perante as graves insuficiências verificadas no terreno”.

Questionado pelo Expresso se o inquérito da Segurança Social diz o contrário do da OM, António Costa respondeu afirmativamente. “Diz. Não vamos concentrar-nos num relatório de uma instituição a quem são feitas graves acusações nos outros relatórios. Em julho, a ministra mandou abrir um inquérito e comunicou esse inquérito ao Ministério Público”.

Além do relatório da Segurança Social, a Inspeção-Geral da Saúde está a realizar um inquérito. “A ministra da Saúde também ordenou um inquérito à Inspeção-Geral da Saúde, perante as informações contraditórias, umas da Ordem dos Médicos, outras da ARS do Alentejo, outra da própria entidade [dona do lar], onde os factos são contraditórios e é preciso apurar ver se há responsabilidades”, afirmou António Costa ao Expresso.

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