França apreende traineira britânica e faz subir a tensão entre os dois blocos

No meio das disputas entre Londres e Bruxelas sobre o pesadelo que tem sido a fronteira aduaneira montada entre a ilha da Irlanda e a ilha de Inglaterra – com o tom dos comentários a fazer subir a tensão um pouco mais todos os dias – a França apreendeu esta quinta-feira uma traineira britânica que pescava sem licença em águas territoriais francesas.

A França “usará agora a linguagem da força” numa escalada do debate sobre os direitos de pesca pós-Brexit, disse o secretário de Estado francês para os Assuntos Europeus, Clement Beaune. O barco foi parado ao largo de Le Havre às primeiras horas da manhã e foi depois encaminhado para o cais e “entregue à autoridade judiciária”, enquanto um segundo recebeu uma advertência verbal.

Em comunicado, o governo francês disse que as verificações foram rotineiras, mas admitiu que foram conduzidas “no contexto da discussão sobre licenças com o Reino Unido e a Comissão Europeia”. O arrastão apreendido foi posteriormente identificado como sendo o Cornelis Gert Jan e os proprietários do barco disseram ao jornal “The Guardian” que a embarcação foi devidamente registada junto das autoridades do Reino Unido para pescar em águas francesas ou da União Europeia. O nome do navio não terá sido incluído no registo oficial que foi partilhado com o governo francês, o que terá motivado a ocorrência.

As relações entre os dois sectores pesqueiros de França e do Reino Unido foram um dos dossiês mais difíceis de gerir na fase de preparação para o Brexit – tendo-se verificado quase impossível um acordo que agradasse às duas partes. AS pescas acabaram por ser reguladas pelo acordo geral, mas o certo é que a França têm-se queixado de que o Reino Unido faz tudo para, na prática, impedir a pesca por parte dos armadores franceses.

Paris acabou por dizer esta quarta-feira que novas licenças de pesca para barcos britânicos estariam dependentes da reciprocidade de medidas idênticas tomadas pelos britânicos – e não escondeu que a situação está próxima da rutura.

Segundo o “The Guardian”, Bruxelas confirmara que ainda não conseguiu apoio entre os outros 26 Estados-membros para uma ação comum contra o Reino Unido por meio do mecanismo de resolução de disputas no acordo de comércio e cooperação. Mas, enquanto espera essa aceitação, Paris decidiu agir por conta própria.

Clément Beaune disse que “precisamos falar a linguagem da força, já que essa parece ser a única coisa que o governo britânico entende. Temos sido extremamente pacientes, os nossos barcos de pesca têm sido extremamente responsáveis. Mas em novembro acabou: vamos abrir o diálogo se os britânicos quiserem – é com eles – mas vamos colocar em prática medidas de retaliação porque não há razão para não termos acesso às suas águas quando eles têm acesso aos nossos portos”.

Citado por vários jornais, Beaune ligou a questão sobre o acesso às águas britânicas com a recusa do Reino Unido em implementar totalmente os acordos pós-Brexit para a Irlanda do Norte.