Alargar o mercado interno até Espanha é a estratégia de curto prazo do setor hoteleiro em Portugal. Cristina Siza Vieira, diretora executiva da Associação da Hotelaria de Portugal (AHP), diz ao Jornal Económico que a pandemia da Covid-19 vai levar os países a virarem-se para dentro para incentivar o consumo interno.
“Portugal é dependente do transporte aéreo em mais de 90% e, neste momento, a maior preocupação até ao fim do ano é a retoma do turismo. Mas com as companhias aéreas paradas, vamos estar virados para o mercado interno alargado que é Portugal e Espanha, por ser aqui ao lado e pelo facto de as pessoas poderem vir de carro”, afirma a responsável da AHP. No entanto, a “médio e longo prazo vamos continuar a apostar noutros destinos como já acontecia anteriormente”, salientando que a média nacional do turismo português ronda os 40% e que “fazê-lo crescer mais vai ser vital”.
Para que esse crescimento possa ser feito, Cristina Siza Vieira assume que a preocupação da indústria hoteleira é alinhar-se com “aquilo que é a estratégia do Turismo de Portugal”. “Têm de ser criados produtos mais amigáveis para as famílias, melhores condições de reservas, apostar em pacotes mais económicos e neste alargamento também para o mercado espanhol”, afirma.
Contudo, a responsável da AHP realça que “a hotelaria nunca desprezou o mercado nacional”, na medida em que Lisboa e Porto são como outras cidades de nível mundial que “não vivem muito do turismo interno”. Assumindo que os próximos tempos vão ser diferentes para todos os destinos turísticos devido à pandemia, é muito natural, segundo Cristina Siza Vieira, que sejam “lançadas umas campanhas do vá para fora cá dentro, mesmo a nível mundial, enquanto não existir mais segurança na abertura das fronteiras”.
Na quarta-feira, a AHP apresentou o relatório do segundo inquérito aos seus associados, com as projeções do impacto da Covid-19 até ao final do primeiro semestre, realizado entre os dias 1 e 7 de abril. As estimativas apontam num cenário menos pessimista para perdas de 80% das receitas correspondentes a 1,28 mil milhões de euros, e numa perspetiva mais negativa para quebras de 90%, o que representaria 1,44 mil milhões de euros de prejuízo. No que diz respeito às dormidas, os dados indicam entre 11,8 a 13,1 milhões de dormidas perdidas.
Olhando para os trabalhadores, os dados do inquérito mostram que, em média, 85% vão ficar em regime lay-off, ao qual quase 100% das indústrias irá também aderir.
Recuperar imobiliário para alavancar o turismo
“Tudo o que afeta o turismo afeta o imobiliário, e vice-versa”, refere Luís Lima, presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP), que acredita que em termos de investimento estrangeiro o turismo vai demorar mais tempo a recuperar que o imobiliário, e que será este setor novamente a recuperar o turismo. “Já o fizemos no passado, fomos os primeiros a ir lá fora captar investimento de França e da China. Hoje em dia, dos mais de 40 mil franceses que vivem em Portugal, seis mil estão no Algarve e 18 mil em Lisboa”, acrescentando que “precisamos de manter alguma rota de investimento estrangeiro, mesmo pensando que nos vamos dirigir mais para o mercado interno”.
Opinião partilhada por Hugo Santos Ferreira, vice-presidente da Associação Portuguesa de Promotores e Investidores Imobiliários (APPII). “É essencial, até porque está muito ligado ao turismo, que se arrepie rapidamente caminho na estratégia de limitação aos programas Golden Visa, nomeadamente a autorização legislativa que pretendia restringir a atribuição dos Golden Visa nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto”, isto porque “um turista hoje é amanhã um investidor de Golden Visa, e vice-versa”. E recorda ainda que, em 2019, este programa “representava 700 milhões de euros anuais e 85 milhões de euros em impostos diretos e taxas administrativas para o Estado”.
O responsável diz que “não podendo o imobiliário contar com o turismo nos próximos meses, ou até mesmo no próximo ano, teremos de poder continuar a contar com este regime de captação de investimento estrangeiro”, conclui.
Artigo publicado no Jornal Económico de 09-04-2020. Para ler a edição completa, aceda aqui ao JE Leitor
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