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Joaquim Vale: “A Santos e Vale regressa a Espanha para diversificar e crescer de forma vertical”

A empresa de Transporte e Logística portuguesa regressa, pela porta grande, a um mercado de onde saiu em 2008. A ideia é crescer e dar opções aos clientes que querem fazer crescer as exportações para o país vizinho. Uma entrevista do JE a Joaquim Vale, administrador da Santos e Vale, para ler e ver na íntegra em vídeo.
12 Fevereiro 2024, 07h30

Como é que foi o ano de 2023 no sector da Logística e Transportes, que tem vindo a ser algo afectado nos com problemas na cadeia de distribuição, etc.
O ano de 2023, apesar de todos os constrangimentos, foi um ano bom. Foi um ano em que, nas atividades de Logística, e para a Santos e Vale em concreto – tanto na distribuição como na logística – houve um crescimento significativo. Nós crescemos bastante na parte Logística, abrimos mais dois armazéns e com isso também conseguimos, de alguma forma, dar suporte à operação. Já agora, em 2024 abrimos um novo centro logístico na Maia.

E vão 24 em 2024, certo?
Sim, 24 centros. Exactamente. Com isto pretendemos também dar um suporte à operação Logística na Zona Norte. Anteriormente, só tínhamos plataformas de logística na área metropolitana de Lisboa. Foi um ano relativamente positivo, apesar de todos os problemas decorrentes da ressaca do pós 20-Covid.

Ainda estamos nessa ressaca ou já estamos mais longe disso?
Estamos. Estamos, de alguma maneira, nessa ressaca. Ainda existe esse impacto, porque as cadeias de abastecimento pararam e com isso houve, em alguns produtos em particular, houve um aumento bastante significativo dos custos. Por exemplo, nos equipamentos de transporte, que é uma coisa que nos toca directamente: a compra de camiões.

Mas é dificuldade em obter equipamento? Preços mais caros?
Ambas as coisas. A nível da dificuldade da entrega, o supply atrasou de três meses – que era o que estava antes da Covid – para nove meses, que é neste momento o prazo médio de entrega dos equipamentos. Além disso, os próprios equipamentos aumentaram acima dos 20%.

E as reparações, imagino que também, com a dificuldade de acesso a peças. Para quem tem uma frota grande, isso também é um problema, certo?
É, sem dúvida é um problema. E tem sido um grande desafio também conseguirmos manter os níveis de serviço e os níveis de disponibilidade de equipamentos. Isso porque outra coisa que o pós-conflito nos trouxe foi que houve marcas que centralizaram os seus stocks na Europa, outras marcas fizeram-no em Espanha, mais concretamente em Madrid e Barcelona. E houve um delay de entrega de peças para fazer a manutenção e a conservação dos equipamentos.

Mas essa relocalização das estruturas mais na Europa, ou mais próximo dos sítios de consumo, é ou não uma tendência? É passageiro ou é algo para ficar?
Tem a ver com a questão da centralização. E uma lógica agregadora por parte das grandes multinacionais de terem o máximo stock centralizado num ponto ou dois, no máximo, de modo a poder, de alguma maneira, economizar e ter uma escala de economia logística e de stock. Porque nós sabemos que o stock é um tema sempre muito relevante na estrutura financeira das empresas.

Ainda existem constrangimentos que não tenham a ver com a pandemia, e sim no ambiente de negócios em Portugal, no que diz respeito à logística? E quando digo isto, digo preço dos combustíveis, esse género de coisas. Existe algum obstáculo neste momento que devesse ser atacado pelo poder legislativo?
Em Portugal em concreto, não. Mas em termos globais, sim. Ainda há pouco tempo vimos este constrangimento da passagem do canal [do Suez] com os ataques que houve aos navios no Mar Vermelho e que obrigou os navios a ter que voltar a fazer a rota do Cabo da Boa Esperança. Isso fez com que haja um atraso de quase um mês em toda a lógica marítima de transporte de contentores. E, inclusivamente, houve também um aumento de custos de transporte de contentores. Portanto, neste momento é um dos maiores constrangimentos que existem: a instabilidade e a insegurança que existe no transporte marítimo.

E especificamente para a Santos e Vale?
A nós toca-nos porque também temos uma empresa que faz transporte de contentores e isto, de uma maneira, cria-nos aqui alguns constrangimentos. Além de que também os nossos próprios clientes, que estão a trabalhar connosco, e que têm os stocks nos nossos armazéns, acabam também ter delays de entrega. E têm dificuldades de gestão de aprovisionamento das suas vendas.

Quais é que são as novidades para o crescimento da Santos e Vale neste ano de 2024? Qual é que é o principal projecto que está em cima da mesa?
Nós temos várias ideias que estão em desenvolvimento. Temos a internacionalização para Madrid, a abertura de uma nova plataforma em Madrid, que abriu no início deste mês.

Isso é novidade!
É. E é uma novidade relevante para nós, porque nos vai dar uma maior proximidade para o mercado de Espanha e também podermos, eventualmente, dar serviço aos próprios clientes que temos em Portugal. Nomeadamente aprovisionar e podermos fazer chegar os produtos desses clientes ao mercado espanhol. Nós já estávamos em Espanha através de parcerias, mas uma coisa é nós estarmos a trabalhar através de um parceiro e outra é estarmos efectivamente, com uma estrutura própria logística, com pessoal da Santos e Vale e com a matriz de funcionamento da Santos e Vale. Porque as empresas têm a sua cultura e a cultura é uma coisa que não se consegue passar… Consegue-se construir organicamente, mas é difícil passar a nós. Estamos a crescer também…

Peço desculpa mas temos de explicar um pouco melhor esta abertura em Madrid. É um regresso da Santos e Vale a Espanha, correto?
Sim. Nós estivemos em Espanha entre 2002 e 2008.

Saíram por altura da crise do subprime deles?
Antecedemos um pouco a crise de 2009 deles. Foi algo que conseguimos, de alguma maneira, prever, pela percepção que tínhamos ao estar no mercado. Montamos uma estrutura e tivemos essa estrutura a funcionar entre 2002 e 2008. E depois achámos que podíamos fazer a gestão operacional do serviço através de Lisboa e dar, à mesma, um serviço ao cliente através da nossa sede em Lisboa. E por isso, a partir de 2008, achámos por bem que não fazia sentido estarmos presentes no mercado espanhol.

E agora?
Agora achamos que, pela dimensão que a Santos e Vale tem e pela infraestrutura que tem, pelo reconhecimento da própria marca, que já não é um reconhecimento só em Portugal, a marca Santos e Vale já é uma marca bastante conhecida, mesmo em Espanha, achamos que é o momento certo. Até porque a dimensão que a Santos e Vale tem hoje é, sem dúvida, diferente do que tinha em 2008.

Como é que se processou esse negócio? Foi através da aquisição de algum de alguma empresa local? Adquiriram uma das parceiras. Como é que foi?
Não. Nós, por acaso, pensámos se a melhor estratégia não seria a aquisição. Se seria fazer uma parceria com uma empresa local ou se, eventualmente, seria fazermos uma abertura e um crescimento orgânico com a nossa própria equipa. A Santos e Vale sempre tem crescido termos orgânicos. A nossa filosofia de crescimento tem sido essa e, mais uma vez, apostámos no crescimento orgânico. Nós conhecíamos e conhecemos pessoas que estão no mercado [espanhol] e que estão estão a viver em Madrid. E convidamos uma dessas pessoas para liderar este projecto de abertura.

Passou pela aquisição de um espaço?
Não, não obrigatoriamente. Nós alugamos um espaço. Hoje em dia é fácil de o fazer. A zona de Madrid tem muita oferta em termos de áreas logísticas. Em Espanha é relativamente fácil. Nós identificamos um lugar que está estrategicamente colocado em Coslada, uma zona específica que está perto do aeroporto de Barajas e consegue servir tanto a zona mais a ocidente como mais a oriente da cidade. Montámos a estrutura, criámos uma equipa, deslocámos meios para lá e está a funcionar.

É um primeiro ponto de apoio e depois pode haver expansão a outros locais de Espanha, nomeadamente na Andaluzia ou na Catalunha?
Sim, sem dúvida. Nós também temos neste momento uma pessoa que está na zona da Galiza, a desenvolver mercado. É uma pessoa que também contratámos para fazer o desenvolvimento de negócio nessa área. Eu diria que é uma aproximação, não é uma questão de pôr o pé. O mercado espanhol é um mercado muito grande. É um mercado muito maduro, que conheço já há alguns anos. Trabalho directamente desde 2000 – já há alguns anos, portanto – e é um mercado muito maduro, um mercado muito experiente.

Há muitas empresas de dimensão semelhante com uma oferta muito forte.
Sim, sim, sim. As empresas em Espanha, normalmente, são empresas muito profissionais, muito estruturadas, bem organizadas, muito competitivas.

Por isso lhe perguntava. Qual é que é o elemento diferenciador da Santos e Vale em Espanha face à concorrência forte que lá tem?
Realmente esse é o bottom line, porque com a estrutura que nós temos em Portugal, nós podemos efectivamente oferecer ao mercado espanhol um serviço diferenciador, com mais qualidade. As empresas, os clientes que tiverem necessidade de um serviço de grande profissionalismo em Portugal poderão encontrar através da Santos e Vale, porque nós já temos essa oferta de valor em Portugal e podemos replicar o que know-how temos de Portugal para Madrid.

Como é que isto se mede neste sector? Não é uma pergunta retórica: como é que se mede essa qualidade? Pontualidade? Capacidade de entrega? Não haver estragos no material transportado?
Eu dou outra ideia: mede-se em relação. Porque quando se está numa relação…

E em preço também, suponho.
O preço faz parte, mas no final do dia não é o mais importante. Porque o cliente que prefere uma empresa por preço é sempre um cliente que está a termo. Porque no dia em que vier um operador que tenha um preço cinco cêntimos mais barato ele vai embora. Mede-se em relação. E a relação tem que ver efectivamente com tudo aquilo que disse. Eu se quiser ter o meu cliente satisfeito tenho de lhe dar isso tudo: um serviço de qualidade, pontual, fiável, que não estrague a mercadoria, os bens deles, e que esteja enquadrado em termos de preço, senão ele vai-se sentir enganado. De modo que é uma questão

A Santos e Vale tem uma boa base de clientes em Espanha?
Temos. Mas nós não estamos só focados nos clientes de Espanha. O nosso objectivo é também dar aos nossos clientes em Portugal um serviço para Espanha. Há muitos clientes em Portugal que não têm um bom suporte logístico em Espanha. E isso faz falta também para poder potenciar as vendas e as exportações.

Podem não estar a vender o suficiente em Espanha porque não conseguem pôr o produto lá?
Tal e qual.

A Santos e Vale não é a única empresa portuguesa de logística em Espanha. Mas com isto vai entrar num campeonato maior, é esse o plano?
Sim, o mercado de Espanha é cinco vezes maior que o nosso. A escala é totalmente diferente, e o potencial de oportunidades também. Há boas empresas de logística em Portugal que estão muito bem instaladas em Espanha e com muito sucesso. Há empresas portuguesas de logística que já vendem duas vezes mais em Espanha do que vendem em Portugal.

E é esse o vosso objetivo também?
Sem dúvida, o nosso objectivo é tentar diversificar e fazer crescer o negócio de uma forma vertical.

A pessoa que convidaram para ficar lá a liderar esse projecto já tem objectivos para o final do ano de 2024? O que é que ele tem de fazer para se manter em funções?
(Risos)

Se calhar estou aqui a pôr um bocado de pressão.
Não tem que fazer muito. Tem só que fazer arrancar o negócio. É uma pessoa muito experiente, uma pessoa que está no mercado há 30 anos. Não vai ser difícil potenciar o negócio, até porque ele está no sector há 30 anos. Eu conheci-o a em 2002, há 20 e muitos anos, quando nós os dois éramos jovens. Agora já não somos assim tão jovens. Continuamos em bom estado, mas já não somos assim tão jovens. Já na altura estávamos no sector e, na altura, ele era meu cliente. Representava um cliente nosso.

A Santos e Vale continua atenta a aquisições em Espanha ou em Portugal para se reforçar, apesar da aposta ser o crescimento orgânico?
Não, não rejeito essa hipótese. Nós em 2023, mais ou menos a meio do ano, adquirimos uma empresa de transportes, que estava ligada à área dos contentores de transporte marítimos. E também adquirimos uma empresa ligada à parte dos trânsitos para a África, nomeadamente Angola, Moçambique e São Tomé e Príncipe. Adquirimos essa empresa, que agora estamos a reestruturar, a ajudar a dar a sustentabilidade para poder, eventualmente, estar no mercado e continuar a crescer. Portanto, estamos atentos. Mas o nosso foco em termos de estratégia de crescimento não é, de todo, a aquisição. É a visão do crescimento orgânico.

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