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Turismo. Regiões querem mais orçamento para recuperar mercado

Promoção das regiões ainda é feita a olhar para o mercado doméstico, que é visto como insuficiente. Ambição é recuperar turistas espanhóis, ingleses e brasileiros, mas a retoma só é esperada em 2023.
6 Junho 2021, 19h00

A pandemia de Covid-19 levou o turismo português para um oceano de incertezas, interrompendo três anos consecutivos de franca expansão. Apesar da crise instalada, as entidades regionais não baixaram os braços e continuaram a promover o território, focando-se, desde há um ano, no mercado doméstico, para atenuar o tombo, apostando nos canais digitais para campanhas além-fronteiras. Só que o mercado doméstico é um balão de oxigénio insuficiente e a competição no mercado externo é feroz. Os responsáveis das entidades regionais de turismo que falaram ao Jornal Económico (JE) acreditam que 2021 será um “ano zero”, mas já com melhorias face a 2020, tendo em conta o gradual desconfinamento das populações, com a recuperação a ser visível em 2023. Os próximos dois anos serão marcados por “batalhas” de marketing entre os Estados europeus, visto que não é só o turismo português que precisa de recuperar. Por isso, as entidades regionais pedem um reforço de orçamentos para enfrentar a concorrência.

O turismo nacional é trabalhado, de forma centralizada, pelo Turismo de Portugal, mas são as entidades regionais que promovem cada território dentro do país e no mercado alargado que é Espanha. Cabe às agências de promoção externa, parceiras das entidades de turismo, promover as regiões no resto do mundo. “Para estas instituições poderem entrar na batalha da promoção são necessários orçamentos à medida das atuais circunstâncias”, reivindica o presidente do Turismo do Porto e Norte, Luís Pedro Martins.

“Não podemos estar a trabalhar com os mesmo orçamentos que tínhamos antes da pandemia. Da mesma forma que nós caímos, caíram mercados como Itália, Espanha ou França, que são mercados concorrentes e que viviam com grande tranquilidade, porque eram muito maduros e muito fortes. Agora, vão voltar a atacar. E a frota que têm para atacar é muito diferente da nossa. Prevejo uma batalha de comunicação entre destinos muito forte. Nós temos que ter também os meios para poder trabalhar nessa promoção. E a promoção custa bastante dinheiro”, argumenta.

Defende, também, que o reforço de orçamentos deve ser acompanhado pela manutenção de apoios às empresas, para que a qualidade do serviço no turismo “não seja inferior” à que havia há dois anos, diz ao JE.

Do lado do Turismo do Centro, que é presidido por Pedro Machado, chega também uma proposta concreta: “Há três premissas base que deveriam ser colocadas em cima da mesa. Primeiro, o reforço do mercado nacional e internacional através do próprio Turismo de Portugal, uma vez que vamos ter a concorrência direta e indireta dos mercados concorrentes a reforçar-se, como Espanha; [depois], a necessidade de aumentar e reforçar a tesouraria das pequenas e microempresas, porque elas não vão conseguir sobreviver a um semestre de 2021 completamente parado; terceiro, reforçar os orçamentos dos destinos regionais, sobretudo para eles poderem alavancar o turismo ibérico, aquele que nos pode ajudar a ter uma nova estratégia não apenas de promoção, mas de fidelização. Ou seja, termos meios que permitam em 2021 e 2022 retirar partido desta redescoberta que houve do mercado interno”.

Já do extremo sul de Portugal, a tónica não é o reforço orçamental. Ao JE, João Fernandes, presidente do Turismo do Algarve, explica que para impulsionar as campanhas atuais foram utilizados os contratos que não tinham sido executados a 100%, em 2020. “Os nossos contratos ficaram com excedentes e nós aproveitamos isso para antecipar a contratação para este ano”, revelou.

 

Campanhas online para recuperar mercado externo
Independentemente de se concretizar o ambicionado reforço orçamental, prosseguem os trabalhos de promoção para este ano, que passam por ações publicitárias e de marketing associadas ao destino e campanhas de notoriedade online.

No caso do Turismo do Algarve, que procura alavancar o potencial da região turística mais mediática do país, a aposta recai na promoção internacional, através de parcerias com companhias aéreas e operadores turísticos e campanhas de marketing de destino. Dada a impossibilidade de trazer à região os parceiros e a imprensa estrangeira da especialidade, o Turismo do Algarve aposta no digital para dar a conhecer locais como a Costa Vicentina, a Ria Formosa e os Sete Vales Suspensos.

Segundo João Fernandes, o objetivo é preparar terreno para que saiam reforçadas as ligações aéreas ao Algarve, assim que a aviação comercial voltar a despertar. Para 2021, há parcerias com as companhias LionAir e EasyJet, “que representam cerca de 60% dos passageiros desembarcados no Algarve”, bem como com a Jet Tour e a British Airways. “Uma das campanhas com a EasyJet já provocou um acréscimo de pesquisas por voos para o Algarve de 40%, com altas taxas de conversão. É exatamente isto que nós queremos”, diz o presidente do Turismo do Algarve.

Reino Unido, Alemanha, Espanha, Holanda, Irlanda e França são os mercados-alvo do Algarve.
Para o Turismo do Centro, o foco internacional passa por Espanha. “Estamos a dirigir uma campanha para as províncias espanholas e que têm contiguidade com o Centro do país, em concreto a Extremadura e Castela e Leão. Estamos a procurar reforçar o nosso primeiro mercado externo”, refere Pedro Machado.

Luís Pedro Martins, por sua vez, relata que este é um ano de muita promoção externa, suportada por uma “aposta numa forte comunicação digital”. Neste caso, Espanha, Brasil e França são prioritários, mas há também a preocupação de manter ativo o interesse de turistas alemães, holandeses, norte-americanos e canadianos, que começaram a descobrir a região há dois anos, antes da pandemia.

Além das campanhas junto dos principais mercados emissores de turistas para Portugal, as entidades regionais auscultadas pelo JE salientaram a importância de passar a imagem de país seguro. E aí, a certificação ‘clea&safe’ capta elogios, até porque os turistas vão estar atentos às questões de segurança quando retomarem viagens turísticas. Só o Turismo do Porto e Norte regista “mais de cinco mil selos espalhados pelas empresas ligadas ao turismo”.

 

Mercado doméstico é oportunidade, mas só no Centro o foco é a 100%
Apesar da contínua aposta na promoção das regiões nacionais no estrangeiro, o contexto pandémico obriga a que as entidades turísticas olhem seriamente para o mercado doméstico. O mesmo exercício têm de fazer os turistas nacionais, que por força das circunstâncias passaram a procurar destinos dentro do país. Mesmo com o processo de desconfinamento, em 2021 o mercado interno continuará a ser “a grande oportunidade”, segundo João Fernandes, do Turismo do Algarve. “Já o ano passado foi a grande âncora da procura”, diz.

Mas o mercado doméstico é visto apenas como uma bomba de ar no sector, uma vez que a retoma passará sempre pelo mercado externo. Mesmo quando as entidades regionais falam do mercado interno, acabam por alargá-lo até às zonas transfronteiriças de Espanha, devido à contiguidade territorial.

Para o presidente do Turismo do Porto e Norte, o mercado doméstico foi duplamente importante, no último ano: “Permitiu aos portugueses descobrir o território nacional”, sobretudo o interior, fazendo com que hoje “existam ofertas muito interessantes em todo o país”; e ajudou a travar o tombo do sector em plena pandemia. “Mas não é compensador”, garante. “Mesmo com essa ajuda em 2020, que foi importantíssima para criar um balão de oxigénio nesses territórios, os turistas nacionais – e estou a referir dados globais do país – viajaram menos quase 28% do que em 2019”, sublinha Luís Pedro Martins, sublinhando que o turista português não vai compensar “o que se perde com a falta de turistas estrangeiros”.

Nesta perspetiva, entre as entidades ouvidas pelo JE, só o Turismo do Centro tem uma “aposta direta e concreta” para fazer do mercado interno o verdadeiro objetivo. Por isso, a principal campanha do Turismo do Centro se intitula “Aqui Entre Nós” e procure colocar a região centro no topo das preferências do turista português. A campanha é complementada com uma parceria com a cadeia de distribuição Continente, que oferece aos “quatro milhões de consumidores com cartão continente” estadia em hoteis de três estrelas a partir de 89 euros, a partir de 99 euros em hoteis de quatro estrelas e a partir de 109 euros em hotéis de turismo em espaço rural. Com esta campanha, Pedro Machado antevê conquistar “pelo menos, dez mil noites”, até ao fim de outubro.

“O foco é o mercado interno, claramente. Em 2020, percebeu-se que o interior de baixa densidade, que foi durante muitos anos um constrangimento para a visita dos turistas, tornou-se num factor de atratividade. Perceberam os portugueses não só a extraordinária qualidade do nosso destino, como acabaram por serem eles a recomendá-lo. Acreditamos que em 2021, com o processo de vacinação em curso, aumentará a confiança dos portugueses. E isso seguramente que vai contribuir também para aumentar a atratividade desta parte do território”, assinala.

 

Entidades regionais procuram cooperar e articular-se entre si
Não obstante as prioridades de cada entidade regional, visíveis nas estratégias de promoção de cada região, os gestores afirmam que importa trabalhar também numa articulação entre entidades regionais. O Turismo do Centro trabalha desde 2017 com o Turismo do Alentejo e, desde 2019, com o Turismo do Porto e Norte, procurando “reposicionar” em conjunto as zonas nacionais contíguas a Espanha, por exemplo. “Espanha e Portugal são a maior placa recetiva de turistas do mundo. Só em 2019, entraram 87 milhões de turistas estrangeiros em Espanha e 27 milhões em Portugal”, revela Pedro Machado.

Mas o trabalho articulado foi interrompido pela pandemia. E a ideia é, também, que o trabalho conjunto não se esgote em Espanha. Luís Pedro Martins refere, por exemplo, que “faz todo o sentido” abordar um mercado da dimensão do brasileiro em conjunto, em vez de cada região atuar isoladamente. “A partilha permite-nos ganhar escala”, remata.

 

Retoma do sector prevista apenas em 2023
Questionados sobre as perspetivas de evolução, os responsáveis do Turismo do Algarve, do Turismo do Porto e Norte e do Turismo do Centro, concordam que este é o ano de arranque de uma recuperação que só se sentirá em 2023.

“A ideia que todos temos é que a melhor condição será em 2023. Mas o que temos como referência é que, a partir de meados de maio deste ano, com os planos de desconfinamento de Portugal e com os planos de desconfinamento e vacinação a chegar à sua fase mais avançada na Europa, este seja um ano zero, para dar início à recuperação”, afirma João Fernandes, do Turismo do Algarve.

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