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Subida abrupta dos juros ameaça sustentabilidade da dívida nacional

A CMVM considera que uma subida abrupta das taxas de juro poderia levar a uma deterioração da situação orçamental e da sustentabilidade a médio prazo da dívida portuguesa.
14 Janeiro 2022, 17h55

Com a pandemia a paralisar as economias, os países tiveram de adotar um conjunto de medidas para apoiar tanto empresas como famílias. Portugal, país que contava já com um elevado nível de endividamento, acabou por ver a dívida pública disparar. A retoma aliviou os receios com este “fardo”, mas os riscos persistem. A CMVM alerta que, perante as pressões inflacionistas, uma subida abrupta dos juros pode pode colocar a sustentabilidade da dívida novamente em causa.

“O ano de 2020 foi marcado pela forte deterioração dos saldos orçamentais, e consequente crescimento da dívida pública das principais economias avançadas. Esse aumento resultou da adoção de medidas governamentais destinadas a conter a crise sanitária e os seus efeitos sobre a atividade económica”, começa por dizer a CMVM no “Risk Outlook” para 2022, divulgado esta sexta-feira.

Em Portugal, num ano que ficou marcado por uma forte contração económica, o superavit de Mário Centeno passou a um défice orçamental de 5,7%, contribuindo para o agravamento do rácio da dívida pública em percentagem do PIB para 135,2%.

“No início da pandemia, uma das principais preocupações estava associada à possibilidade de os países com finanças públicas desequilibradas poderem ser rapidamente empurrados para uma dívida pública em forte crescimento e insustentável. Sendo ainda um risco, os piores receios parecem ter diminuído, em parte porque o crescimento económico foi retomado”, perspetivando-se que o PIB tenha um crescimento em torno de 5%.

A diminuição dos riscos apontada pelo regulador tem em conta também o facto de “as expectativas de inflação ainda estarem relativamente contidas e as taxas de juro permanecerem historicamente muito baixas” na Zona Euro.

De acordo com a mesma entidade, “uma recuperação robusta da atividade económica para níveis pré-pandemia permitirá aliviar aquele indicador de sustentabilidade das finanças públicas, tanto em Portugal, como no agregado da Zona Euro”, prevendo “uma estabilização ou mesmo um ligeiro decréscimo do rácio da dívida pública das economias” do bloco nos próximos dois anos.

Há, no entanto, um conjunto de riscos que poderá surgir com impacto direto na sustentabilidade da dívida pública portuguesa, nomeadamente uma subida abrupta das taxas de juro.

Uma subida abruta das taxas de juro tenderia a agravar as condições de financiamento e os encargos com novas emissões de dívida pública, deteriorando a situação orçamental e a sustentabilidade a médio prazo da dívida portuguesa.

“As economias avançadas têm beneficiado de condições financeiras ultra acomodatícias, que se deverão manter durante o processo de reabertura dos setores mais afetados pela pandemia. Porém, as pressões inflacionistas sentidas, em particular nos EUA, podem desencadear alterações relevantes na condução da política monetária no curto prazo, com a antecipação da “normalização” monetária e o consequente aumento das taxas de juro”, refere a CMVM.

Apesar de o Banco Central Europeu não perspetivar uma mexida nos juros durante este ano, está a aumentar a pressão para travar a escalada de preços na Zona Euro, onde a inflação está nos 5%. “Uma subida abruta das taxas de juro tenderia a agravar as condições de financiamento e os encargos com novas emissões de dívida pública, deteriorando a situação orçamental e a sustentabilidade a médio prazo da dívida portuguesa”, alerta a CMVM.

Retoma mais lenta pode gerar “fortes perdas” para o Estado com apoios concedidos

Por outro lado, as medidas adotadas para apoiar as empresas em dificuldades, como as linhas de crédito garantidas pelo Estado, podem também vir a ser um risco para as contas públicas. “Entre os principais desafios orçamentais de Portugal e de outros países da Zona Euro encontram-se as responsabilidades contingentes assumidas durante a pandemia”, salienta a entidade liderada por Gabriel Bernardino.

O regulador assinala que “existem diferenças intracomunitárias relevantes na resposta à crise pandémica, sendo que os países com menor margem orçamental – como é o caso de Portugal – foram os que dirigiram mais apoios ao setor privado assentes em garantias públicas a empréstimos bancários (e linhas de crédito) e moratórias”.

Além disso, diz, “poderá assistir-se a uma reconfiguração dos apoios desta natureza”. Isto porque, “se no início da pandemia os apoios tinham por objetivo atenuar problemas de liquidez e de financiamento das empresas, atualmente também se focam na redução de riscos de solvência”.

Nesse sentido, “no caso de uma retoma menos forte e mais prolongada, as responsabilidades contingentes poderão materializar-se em fortes perdas para o setor público e/ou obrigar à conversão de parte desses apoios e garantias públicas em injeções de capital a fundo perdido”.

Em Portugal, o total de garantias emitidas em 2020 para linhas de crédito atingiu 6,4 mil milhões de euros.

 

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