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Uma ideia simples para fazer crescer a economia

O Estado português paga uma taxa de juro real pouco superior a 1% para contrair empréstimos de longo prazo. Será assim tão difícil encontrar projetos com uma rentabilidade superior?
26 Maio 2017, 13h08

Há muitas e boas razões para se desconfiar dos economistas em geral, e dos macroeconomistas em particular. A incapacidade da maioria em antecipar a crise de 2008, bem como o aconselhamento errático que foi dado depois desta deflagrar (sim, em 2011 o BCE ainda achava que era uma boa ideia subir a taxa de juro), mostram bem como devíamos tomar com um grau de sal boa parte das afirmações produzidas pela classe. Mas entre o lote restrito de macroeconomistas que cumprem os requisitos de humildade intelectual, curiosidade incessante e uma enorme experiência prática, há um que vale a pena ouvir com atenção. Se só puderem dar ouvidos a um, escolham este sem hesitar.

O economista é Olivier Blanchard, senior fellow no Peterson Institute, ex-diretor de investigação do FMI, antigo professor do MIT, um dos fundadores da moderna macroeconomia e possivelmente, como colocou o Washington Post num perfil escrito há poucos anos, “o economista mais esperto de que poucos ouviram falar”. Blanchard esteve na semana passada em Lisboa a discutir o passado e a antecipar o futuro da economia portuguesa, e num paper escrito a meias com um coautor de longa data, pôs em cima da mesa várias propostas para Portugal. Uma, que vale a pena levar a sério, é simples: mais investimento público.
Para um país com uma dívida na casa dos 130% do PIB, o conselho de Blanchard pode parecer lunático. A ideia, porém, tem pouco de surpreendente. Suponhamos que uma empresa endividada recorre a um empréstimo para financiar um determinado investimento. É verdade que a sua dívida aumenta, mas se o investimento tiver retorno também aumentam as suas receitas – e, por conseguinte, a sua capacidade de pagar o empréstimo. O negócio com o banco deixou a empresa mais endividada, mas ela acabou mais sólida, e não mais vulnerável.

Fasquia está baixa
Tudo o que é necessário, portanto, é que o retorno do investimento seja superior ao custo do empréstimo. E aqui chegamos a um ponto importante: a “fasquia” que tem de ser batida para que um projeto passe nesta avaliação de custo-benefício está hoje em mínimos históricos. Neste momento, Portugal consegue financiar um empréstimo a 10 anos com uma taxa de juro pouco superior a 3%. Tendo em conta a inflação esperada para o mesmo período temporal representa uma taxa de juro real baixíssima: qualquer coisa na casa dos 1,4%.

Ponhamos as coisas nestes termos. Portugal tem óptimas infraestruturas de transporte rodoviário, que aparecem quase sempre bem nos rankings internacionais (alguém por aí precisa de uma auto-estrada?), mas há lacunas significativas ao nível de infraestruturas portuárias. Tem melhorado bastante nos indicadores educativos, mas continua a ter um défice de qualificações e universidades pouco ligadas às empresas. Será que entre infraestruturas, educação, ciência, energia e tecnologias de ponta não se encontram projetos com um retorno real superior a 1,4%? Se a resposta for não, o mais provável é não estarmos a procurar bem.

Aliás, uma das particularidades da economia portuguesa é o facto de a taxa de juro real estar a cair de forma gradual, mas consistente, pelo menos desde o fim dos anos 90. A imagem da direita põe esta evolução em perspetiva. Com exceção do período 2011-2013, em que as taxas de juro exigidas a Portugal escalaram para níveis impressionantes, a tendência afigura-se clara: o custo real dos empréstimos do Estado parecem progressivamente menores. Nos anos 90, por exemplo, só faria sentido levar a cabo investimentos com retornos superiores a 3%.

Os sinais do mercado, contudo, parecem não ter tido impacto visível na política orçamental portuguesa. O investimento público está em queda acelerada desde os anos 90, e mesmo se em 2017 se espera uma ligeira retoma face ao mínimo registado em 2016, a verdade é que continuará em níveis baixíssimos. E no braço de ferro entre despesas correntes e de capital, têm sido claramente as primeiras a levar a melhor. Portugal está a investir pouquíssimo, na altura em que o investimento faz mais sentido.

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