Inicialmente, vigoraram regras de subcapitalização, as quais determinavam que o endividamento (apenas perante entidades relacionadas não residentes – a data altura, excluindo-se as residentes na U.E. – ou garantido por tais entidades) se deveria limitar a duas vezes o correspondente valor dos capitais próprios, sob pena de os juros considerados excessivos (por excederem o rácio de 2:1) não serem dedutíveis para efeitos fiscais, salvo mediante adequada e devidamente comprovada justificação (não exequível se a entidade credora se encontrasse num paraíso fiscal).
Em 2013, as regras de subcapitalização foram substituídas pela regra da limitação dos gastos de financiamento líquidos (aplicável a todo o tipo de financiamento, incluindo de entidades não relacionas e também de residentes), a qual veio a estabelecer que os gastos de financiamento (líquidos de proveitos de similar natureza) somente passaram a ser dedutíveis até ao valor anual correspondente ao maior entre (i) Euro 1.000.000 (inicialmente Euro 3.000.000) ou (ii) 30% (inicialmente 70%, com redução progressiva) do EBITDA (conceito que tem vindo a evoluir até à transposição da ATAD I em 2019). Os denominados “excessos” ou as “folgas” são passíveis de reporte durante cinco exercícios. Existe, ainda, a possibilidade (mediante opção) de computar esta limitação numa lógica de grupo, quando seja aplicado o RETGS.
Mas a capitalização das empresas não pode depender apenas da limitação à dedução dos gastos de financiamento quando se visa reduzir a distorção dívida-capitais próprios e, portanto, foram introduzidas normas que contemplavam incentivos.
Assim, surgiu a DLRR – aplicável a micro, pequenas e médias empresas – que atualmente prevê uma dedução de 10% dos lucros retidos e reinvestidos até Euro 1.200.000 anualmente. Por outro lado, a RCCS – inicialmente aplicável apenas a micro, pequenas ou médias empresas, mas atualmente também aplicável às demais empresas – permite a dedução (durante 6 exercícios) de um juro nocional de 7% sobre o montante das entradas (em dinheiro, por conversão de créditos ou via recurso aos lucros) realizadas até ao montante de Euro 2.000.000. Ambos os benefícios encontram-se excluídos da limitação constante do 92.o do Código do IRC.
A PLOE 2023 pretende, muito com base na proposta de Diretiva (da Comissão) apelidada de DEBRA, introduzir um regime fiscal de Incentivo à Capitalização das Empresas (ICE), revogando a DLRR e a RCCS. Resumidamente, o ICE poderá ser descrito como se segue:
Dedução durante 10 exercícios.
No entanto, ao contrário da DLRR e da RCCS, o ICE não se encontra excluído da limitação prevista no artigo 92.o do Código do IRC, embora tal possa ainda vir a ser introduzido no âmbito da discussão na especialidade da PLOE 2023.
Surpreendentemente, o ICE não parece vir acompanhado de qualquer limitação adicional à dedução de gastos de financiamento. Recorde-se que, nos termos da RCCS, o limite de 30% do EBITDA desce para 25% e, de acordo com a proposta de Diretiva da DEBRA, 15% dos gastos de financiamento deixam, pura e simplesmente, de ser dedutíveis para efeitos fiscais.
Quanto a normas anti-abuso, que poderão limitar a aplicação dos incentivos e, principalmente, evitar duplas deduções, as mesmas encontram-se patentes na RCCS e serão ainda mais desenvolvidas no regime fiscal do ICE.
O tema do endividamento e capitalização das empresas, instituindo-se, por um lado, limitações à dedução de gastos de financiamento e, por outro lado, incentivos ao reforço dos capitais próprios (de modo a mitigar a diferenciação da “vantagem fiscal” entre financiar mediante dívida vs. capital próprio), está longe de se encontrar estabilizado.
O que parece ser uma boa notícia para as empresas portuguesas, i.e., ter acesso a uma dedução sem penalização adicional dos gastos de financiamento, poderá revelar-se de curta duração se Portugal for obrigado a transpor a Diretiva relativa à DEBRA em moldes similares ao que atualmente se encontra proposto.Se e quando vier a ser aprovada pelos vários estados-membro da U.E., embora seja expectável um período transitório para a sua aplicação prática às empresas que já se encontrem a aplicar a RCCS e/ou o ICE.
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