“É parte visceral do património japonês, tal como a cerejeira, o samurai ou o haraquíri. Falar do Japão sem referir a gueixa, seria o equivalente àquele que, tendo ido à Exposição de Paris de 1889, não reparou na Torre Eiffel.”
A gueixa é apenas um dos milhares de pormenores que fazem do Japão, a olhos ocidentais, um lugar tão exótico, quase como se de outro planeta se tratasse. Esta estranheza é normalmente acompanhada de uma profunda admiração pela beleza e delicadeza de tudo o que respeita ao país – mesmo quando se visita Tóquio, hoje uma megalópole que o jornalista e escritor francês Albert Londres não reconheceria, é frequente o visitante comentar, tão perplexo quanto maravilhado, a ausência de ruído; e por cá, bem sabemos como o tecido urbano é constantemente manchado com sons tonitruantes, das buzinas à música que invadiu não só os espaços comerciais, como também o espaço público.
Albert Londres percorreu a Ásia em 1922. Começando pelo Japão, atravessou o país nipónico através das suas principais cidades e dos lugares mais emblemáticos. Londres observou atentamente um povo que iria, como o próprio previu, marcar inegavelmente a geopolítica mundial dos anos seguintes. A viagem de iniciante, como o próprio autor descreve, seria marcada pela descoberta constante, ou não fosse Londres um observador atento ao detalhe.
O tom é tão informativo como divertido – são vários os momentos hilariantes – e o autor ressente-se mais da distância entre a França e o Japão pela indecifrabilidade da sociedade japonesa do que pelos quarenta e seis dias que demorou a lá chegar.
Essa dificuldade de os ocidentais lerem os sinais e os gestos – a que esse grande actor chamado Bill Murray dá corpo em “O Amor É Um Lugar Estranho” (infeliz título português do filme de Sofia Coppola, “Lost in Translation”) – deve-se, essencialmente, à impenetrabilidade de um povo que vive mais para o interior de si mesmo e que observa regras sociais quase nos antípodas das dos europeus.
O inverso é, naturalemente, igualmente verídico, havendo mesmo uma síndrome denominada “de Paris”, fenómeno que atinge alguns turistas japoneses que visitam a capital francesa e sofrem um colapso nervoso, pois esta (e, sobretudo, os seus habitantes) está longe de corresponder à imagem idealizada.
Curiosamente, foi no mesmo ano que o jornalista francês visitou o Japão que Eduardo, então Príncipe de Gales – e, mais tarde, Eduardo VIII, que viria a abdicar para poder casar com a norte-americana Wallis Simpson –, retribuiu a visita a Inglaterra, no ano anterior, do Príncipe Herdeiro Hirohito (naquela que foi a primeira viagem de um membro da família imperial japonesa fora do seu país).
A edição é da Livros de Bordo, que já publicara, do mesmo autor, o seu relato de viagem pela Índia (intitulado, precisamente, “Na Índia”) e a tradução esteve a cargo de Ana Cristina Leonardo e Diogo Paiva.
Eis a sugestão de leitura desta semana da livraria Palavra de Viajante.
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