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Um ano depois da invasão, Portugal continua a comprar gás natural russo

Apesar de vários países terem reduzido o seu consumo de gás russo via gasoduto, alguns aumentaram as compras de GNL como França ou Espanha. Parlamento europeu quer impor embargo, mas analistas avisam que preços vão disparar.
  • Vasily Fedosenko/Reuters
12 Abril 2023, 12h54

Mais de um ano depois da invasão da Ucrânia, Portugal continua a comprar gás natural à Rússia, à semelhança de outros países europeus.

Depois de o país ter recebido três carregamentos em 2022, em fevereiro deste ano voltou a receber um navio em Sines carregado de gás russo. Mais uma vez, este gás destinou-se à gasista espanhola Naturgy que tem um contrato de longa data, até 2042 com a companhia russa Yamal (detida pela Novatek, a segundo maior fornecedora de gás russa, atrás da Gazprom) que prevê a entrega de 3,4 mil milhões de metros cúbicos por ano. A Novatek tem como acionista (19%) a francesa TotalEnergies, uma das poucas petrolíferas ocidentais que manteve os seus investimentos na Rússia, ao contrário da BP e da Shell. Os lucros da Naturgy subiram 36% para 1.650 milhões de euros, beneficiada pelos preços elevados da energia.

A compra de gás natural russo por Portugal caiu 62% no ano passado face a período homólogo, pesando 13% nas compras do país. Portugal consumiu 62 Terawatts-hora de gás natural em 2022.

O JE pediu uma reação à Naturgy para saber se iria receber mais gás natural em Portugal ao longo deste ano.

Portugal não é extremamente dependente do gás russo, mas mesmo assim a Rússia esteve entre os seus fornecedores em 2022. O ranking é liderado pela Nigéria (2,75 milhões de metros cúbicos normais (Nm3)), seguida pelos EUA (1,88 milhões de Nm3), de Espanha (493 mil Nm3), de Trindade e Tobago (360 mil Nm3), da Rússia (281 mil Nm3) e da Guiné Equatorial (91 mil Nm3), segundo os dados da Direção-Geral de Energia (DGEG). Em 2021, foi importado um total de 5,7 milhões/nm3 de gás natural. A Nigéria liderou (2,7 milhões), seguida dos EUA (1,7 milhões), da Rússia (739 mil), de Espanha (343 mil) e da Argélia (71 mil).

Apesar dos embargos em vigor para o petróleo, carvão e combustíveis, o gás natural não está sujeito a qualquer restrição na União Europeia,

É verdade que tem vindo a reduzir as suas compras via gasoduto (com o ataque ao Nord Stream 1 pelo meio), mas as compras de gás natural liquefeito (GNL) têm vindo a aumentar.

Este dinheiro serve assim, indiretamente, para financiar o esforço de guerra na ucrânia, pois as gigantes Novatek e Gazprom estão entre os maiores contribuintes para o orçamento russo.

As compras europeias de GNL nos primeiros 10 meses após a invasão contribuíram com 14 mil milhões de dólares em receitas para as empresas russas, representando mais de metade das vendas para o exterior. Este valor só é superado pelas vendas para a Ásia oriental, num valor acima de 20 mil milhões de dólares, segundo dados da consultora CapraViem, citados pela “Reuters”.

A Europa comprou 22 mil milhões de metros cúbicos de GNL russo em 2022, um aumento face aos 16 mil milhões registados em 2021, mais 37%. Mesmo assim, o valor fica longe dos 155 bcm comprados todos os anos antes da invasão.

Portugal reduziu as suas compras de gás à Rússia entre 2021 e 2022, mas vários países europeus aumentaram, como a Bélgica, França ou Espanha. Também a China aumentou as compras, segundo dados da Kpler.

“Ao contrário das compras por gasoduto, que estão bloqueadas, vai ser muito mais difícil reduzir as receitas russas ou a dependência global do GNL russo”, segundo o analista Tamir Druz da CapraView, citado pela “Reuters”.

Apesar do desejo de alguns países de impor sanções, existe o risco de provocar um disparo nos preços do gás, o que também vai contribuir para o aumento das receitas russas, além de penalizar as famílias e empresas europeias.

“O essencial das sanções é que não afetem mais quem as aplica do que os visados”, disse, por sua vez, Anne-Sophie Corbeau, investigadora da Universidade de Columbia nos EUA.

O Parlamento europeu tem uma proposta que visa o embargo total do gás russo, mas a medida não é bem vista por analistas e por alguns países, como a Holanda.

“Para alguns Estados-membros pode ser excessivo”, disse o ministro neerlandês da Energia Rob Jetten.

A comissária europeia para a Energia Kadri Simson já defendeu que as empresas e estados europeus devem deixar de comprar gás à Rússia.

A ministra espanhola da Energia Teresa Ribera também já defendeu que as empresas espanholas devem abdicar de assinar novos contratos. Sobre os atuais, quem cancelar o contrato poderá ser obrigado a pagar compensações, caso não haja sanções em vigor.

Já um especialista jurídico que trabalhou no departamento de energia da Comissão Europeia apontou que a ideia do Parlamento europeu pode não ter base legal para avançar, devido às regras de não-discriminação da Organização Mundial do Comércio (OMC), segundo Klaus-Dieter Borchardt da Baker McKenzie.

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