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Autoridade da Concorrência aplicou coimas de 279 milhões ao setor financeiro entre 2003 e 2020

No âmbito da atividade em 2019 de sanções de práticas anti-concorrenciais, as coimas da AdC somavam 225 milhões para a banca, 42 milhões para seguradoras, 48 milhões no setor da energia (à EDP Produção por abuso de posição dominante) e um milhão na manutenção ferroviária (condenação na manutenção ferroviária com imposição de inibição de participação em concursos públicos).
  • Presidente do Conselho de administração da Autoridade da Concorrência, Margarida Matos Rosa
14 Outubro 2020, 13h11

A Autoridade da Concorrência aplicou coimas de 279 milhões de euros na atividade  de investigação e sanção de práticas anti-concorrenciais no setor financeiro. Entre 2003 e 2020 a AdC dá conta de 10 processos tramitados, que deu origem quatro decisões condenatórias, num universo de 12 decisões tomadas no período (das quais seis foram de arquivamento).

Nas quatro decisões tomadas, duas são relativas a práticas da Seguradoras Unidas e Fidelidade, que ocorreram entre 2018 e 2020. O processo dos Seguros teve decisão nos anos 2018 e 2019.

Ainda antes da decisão do processo da banca, que envolveu 14 bancos, em 2019, a AdC sancionou o primeiro cartel no setor financeiro português. Referia-se a Concorrência ao processo das seguradoras.  As empresas envolvidas no cartel combinavam entre si os valores que apresentavam a grandes clientes empresariais na contratação de      seguros de acidentes de trabalho, saúde e automóvel, apresentando sempre valores mais altos, de modo a que a seguradora incumbente mantivesse sempre o cliente.

Da prova apreendida pela AdC resultou que, quando a renovação de um contrato estava em concurso, altos quadros das seguradoras encontravam-se em almoço ou telefonavam-se por via dos telefones pessoais e mediante a utilização de cartões pré-pagos, para indicar o patamar no qual, ou acima do qual, o outro deveria apresentar a proposta, de modo a maximizar as possibilidades de o segurador incumbente conseguir a renovação.

A abertura da investigação ocorreu na sequência de um pedido de clemência apresentado pela Seguradoras Unidas, no que foi seguida pela Fidelidade e pela Multicare.

A Seguradoras Unidas foi a única companhia de seguros a beneficiar de dispensa total de coima por ter sido a primeira a denunciar e apresentar provas da participação no cartel. A Fidelidade e a Multicare beneficiaram de uma redução de coima no âmbito do Programa de Clemência, e participaram num processo de transação, no qual as empresas reconhecem a culpa e abdicam da litigância judicial. Foram condenadas a uma coima total de 12 milhões de euros que foram pagos imediatamente (em 2018) sem contestação. Já a Lusitânia e a Zurich, dois administradores e dois diretores foram condenados ao pagamento de uma coima superior a 42 milhões. Ambos os processos somam 54 milhões de euros em coimas, mas como foram pagos no momento 12 milhões, restam 42 milhões.

“Relativamente à Fidelidade – Sociedade Gestora de Fundos Imobiliários, ainda estamos em fase de acusação, foi feita em setembro, estamos a ouvir a empresa e emitiremos depois uma decisão”, disse a presidente da AdC aos deputados. A Fidelidade adquiriu o controlo exclusivo do fundo de investimento imobiliário Saudeinveste sem notificar a Autoridade da Concorrência. E a AdC acusa a Fidelidade de ter adquirido controlo de fundo de investimento sem autorização.

No âmbito da atividade em 2019 de sanções de práticas anti-concorrenciais, as coimas da AdC somavam 225 milhões para a banca, 42 milhões para seguradoras, 48 milhões no setor da energia (à EDP Produção por abuso de posição dominante) e 1 milhão na manutenção ferroviária (condenação na manutenção ferroviária com imposição de inibição de participação em concursos públicos). Houve sete decisões condenatórias, 5 notas de ilicitude e uma decisão de compromissos.

Em 2019 a AdC condenou 14 bancos por prática concertada com objeto anti-concorrencial. A coima aplicada atingiu o valor total de 225 milhões de euros aos bancos BBVA; BIC (por factos praticados pelo então BPN); BPI; BCP; Banif; Barclays; CGD; CCCAM; Montepio; Santander (por factos praticados por si e pelo Banco Popular); Deutsche Bank e UCI.

As sanções representaram entre 2% e 3% do volume de negócios dos bancos em média, disse Margarida Matos Rosa.

“Os bancos trocaram regularmente, de modo bilateral ou multilateral, informação estratégica não pública, individualizada, atual ou futura sobre preços/spreads  e valores de produção mensal, nos segmentos do crédito à habitação, crédito ao consumo e crédito a empresas (pequenos negócios e PME) durante 10 anos”, relata a Concorrência.

Ao desvirtuar as regras da Lei da Concorrência “através de uma concertação ilícita que lhes permitiu reduzir o risco e a incerteza quanto à atuação dos seus concorrentes diretos, o comportamento dos bancos prejudicou a dinâmica concorrencial e afetou diretamente os consumidores”, conclui a entidade reguladora na sua apresentação à COF.

Todos os bancos recorreram das multas da AdC, e os processos não deverão ter desenvolvimentos antes de 2021.

O deputado do PSD, Jorge Paulo Oliveira, questionou Margarida Matos Rosa com dados do relatório de atividades de 2019, que ainda não é público. “Entre 2004 e 2019 a AdC aplicou multas de 583 milhões de euros e só recebeu 15,5 milhões, isto é, 2,7% do valor total”, confrontou o deputado.

Sobre a robustez das decisões da AdC, de forma a serem confirmadas depois em Tribunal, Margarida Matos Rosa deu o caso de uma condenação à EDP e à Sonae, dona do Continente, no âmbito da parceria criada em 2012 para a implementação da campanha comercial “Plano EDP Continente”, que foi confirmada “há poucos dias” pelo Tribunal.

No fim de setembro o Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão de Santarém (TCRS) confirmou decisão da Autoridade da Concorrência sobre pacto ilícito de não concorrência entre as duas empresas, mas reduziu valor da coima em três milhões para 34,5 milhões. Isto por factos que remontam a 2012.

“Nos últimos 3 ou 4 anos temos tido uma taxa de sucesso judicial de cerca de 85% a 90%”, disse a presidente da AdC que reconheceu que os recursos do regulador são escassos e o processo de recrutamento é lento porque carece de duas autorizações ministeriais.

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