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Défice aproxima-se de 1,1%, mas fórmula de descida suscita debate

A maioria dos economistas consultados pelo Jornal Económico concorda com a previsão do primeiro-ministro. O número do défice publico de 2017 vai ser conhecido esta segunda-feira. Apesar da trajetória de descida ser consensual, os fatores não-recorrentes e a sustentabilidade da estratégia são pontos de análise.
  • Cristina Bernardo
26 Março 2018, 09h20

O défice orçamental deverá ter caído para 1,1% do produto interno bruto (PIB) em 2017, de acordo com economistas nacionais, em linha com a expetativa de António Costa. O valor que o Instituto Nacional de Estatística (INE) anunciar esta segunda-feira ficará certamente abaixo de 2% de 2016, mas a fórmula utilizada para a descida é questionada.

Os cinco economistas consultados pelo Jornal Económico antecipam que o défice tenha ficado entre 1% e 1,5%, sendo o economista-chefe do Santander o mais otimista.

Rui Constantino considera a dinâmica de descida se deve ao “controlo da despesa total das Administrações Públicas, apesar das alterações de composição, mantendo-se o esforço de consolidação orçamental”, aliado a um “impacto positivo do ciclo económico mais favorável, ao nível da receita (impostos e contribuições sociais), assim como da despesa (redução dos encargos com prestações sociais)”.

Francesco Franco, professor da Nova School of Business and Economics (SBE) estima um défice de 1,1%, enquanto Rui Serra, economista-chefe da Caixa Económica Montepio Geral (CEMG) aponta para um intervalo entre 1,1% e 1,2%. Ambos escrutinam a balança entre a entrada e saída de capital e referem que a redução foi conseguida mais pelo lado da receita do que da despesa.

“O grande fator é o crescimento da economia, que possibilita um aumento das receitas fiscais e da segurança social”, explicou Serra, sobre um ano em que a economia portuguesa expandiu 2,7%, o ritmo mais rápido desde 2000.

Nos três primeiros trimestres de 2017, as receitas com impostos (sobretudo IVA e IRC) aumentaram 6%, enquanto as contribuições para a segurança social subiram 5%, na comparação homóloga. A descida do desemprego permitiu uma poupança de 1,2%, face ao período entre janeiro e setembro do ano anterior.

“A despesa cresceu, embora não em termos reais”, acrescentou Franco. “A evolução contida da despesa encerra em si um crescimento maior nas despesas com o pessoal (+2,5%) e menor em consumos intermédios (+0,4%) e até mesmo uma queda (-8%) do investimento. As prestações sociais cresceram na média da despesa total (+1,2%)”.

Fatores irrepetíveis ajudam e incógnita da CGD mantém-se

Apesar de os economistas concordarem sobre a descida, sublinham que a tendência não é linear e há vários pontos de interrogação. Joaquim Miranda Sarmento, professor de Finanças do ISEG cuja projeção alinha com a do Governo, sublinha que há diversos fatores que contribuíram para a descida do défice e não estiveram diretamente relacionados com a estratégia do Executivo.

“Entre 2015 e 2018 (usando as previsões do OE/2018), o défice desceu nominalmente cerca de 3,3 mil milhões de euros. Só os one-offs (PERES, venda F-16, garantia BPP e dos empréstimos Europeus), o aumento dos dividendos do Banco de Portugal e a descida de despesa com juros (dado as baixas taxas de juro, via política do BCE), representam 3 mil milhões de euros de windfall revenues“, afirmou Sarmento, que salienta ainda um elevado volume de cativações.

“Trata-se de uma consolidação conjuntural, dado que o défice estrutural continua em torno de 2%, desde 2015”, acrescentou.

João César das Neves, professor na Católica Lisbon Business and Economics, também é crítico da trajetória do défice, cuja redução considera “está a ser muito lenta”, já que “com uma dívida como a nossa deveríamos estar a ter excedente”.

O economista prefere não fazer a sua própria previsão, mas a última projeção da instituição (de janeiro) é a mais pessimista do grupo e aponta para 1,5%. César das Neves questiona ainda o elevado peso dos impostos indiretos na redução do défice, que “cria uma situação favorável no curto prazo, mas muito frágil no médio e longo prazo”.

Por último, há ainda uma questão por resolver: a contabilização dos custos com a recapitalização da Caixa Geral de Depósitos. Na ótica do INE não conta para o défice de 2017, mas o Eurostat discorda e quer incluir, o que levaria o défice para 3,2%. No início do mês, o deputado socialista Paulo Trigo Pereira afirmou ser provável que o organismo europeu leve a sua avante, mas que garantiu isso não fará com que a Comissão Europeia volte a colocar Portugal no braço corretivo do Procedimento de Défice Excessivo.

Défice quebra a barreira de 1% em 2018

O Governo tem revisto constantemente as projeções para o défice orçamental de 2017. No Orçamento do Estado (OE) correspondente a esse ano, ainda apontava para 1,6%. Entre o Pacto de Estabilidade e o OE 2018 foi descendo 0,1 pontos percentuais de cada vez. A mais recente diminuição foi, há duas semanas, quando António Costa falou de 1,1% no Parlamento Europeu.

Atualmente, a projeção para 2018 é a mesma, já revista e provavelmente ainda por atualizar. Ainda assim, Miranda Sarmento refere que “esta revisão traz alguma margem orçamental”. O professor do ISEG concorda com a estimativa e acrescentou esperar que o Governo mantenha a atual “linha de controlo da despesa de investimento e funcionamento, associado a um bom crescimento da receita fiscal”, este ano.

O consenso aponta para que o défice mantenha a tendência descendente e quebre a barreira de 1%, impulsionado novamente pelo crescimento económico e pela redução da despesa.

“As perspetivas para 2018 são positivas, tendo em conta que a economia portuguesa vai continuar a crescer. Com o objetivo do défice para 2017 cumprido e as contas publicas cada vez mais equilibradas, perspetiva-se alguma margem de manobra orçamental”, referiu Francesco Franco, da Nova SBE.

No entanto, refere que é “preciso acautelar que o crescimento económico esperado para 2018 pode não ser tão superior ao estimado, como aconteceu no ano passado onde foi criada uma margem inesperada”. Acrescentou que problemas mais estruturais (como a crescente divida dos Hospitais EPE ou o baixo investimento publico) poderão pressionar a despesa. “A palavra de ordem é prudência e manter uma policia orçamental contra-cíclica”.

Rui Serra, da CEMG, salientou que o Governo prevê aumentar as despesas com pessoal em 0,3%, nomeadamente devido ao descongelamento de carreiras. Ainda assim, “a despesa continuará a ser especialmente monitorizada, de modo a atingir o objetivo que o Governo se comprometeu com Bruxelas”, afirmou.

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