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‘Quo vadis’ mercado acionista? Onde estão os títulos disruptivos?

A volatilidade regressou. Os bancos centrais deixaram de ter políticas acomodatícias e a FED pode até ir por uma via restritiva. O BCE sobe juros em setembro. Nisto tudo onde ficam as ações?
13 Janeiro 2019, 16h00

Os analistas são unânimes em manterem-se cautelosos. Um relatório de Eugene Philalithis, da Fidelity, que estuda as opções a nível de Global Multi-Asset Income fala em “movimento defensivo” para 2019. Mas também Simon Webber, gestor da Schroders, fala de cautela com as empresas que estão excessivamente endividadas. A equipa de research do BiG – Banco de Investimento Global vê um mercado americano de grande volatilidade para 2019. Afirmam ser “necessário optar por um posicionamento mais seletivo no mercado, optando por setores mais defensivos e com avaliações sólidas”. Nos EUA identificam valor nos setores das utilities, cuidadores de saúde e bens de consumo. A visão do Credit Suisse, é algo diferente. Acreditam no contínuo crescimento da economia global, numa inflação controlada, mas não afastam riscos. O foco, para estes analistas, será nos ativos que não estão dependentes dos ciclos.

Sobre a União Europeia há um consenso generalizado de que haverá um arrefecimento económico e que a UE perdeu em 2018 a oportunidade para normalizar a política económica. Keith Wade, economista-chefe da Schroders diz em nota que perante um cenário de dólar fraco e euro forte, a zona euro ficará com condições financeiras mais apertadas. E se contarmos com uma desaceleração da economia dos EUA, a Europa ficará numa situação mais complicada para continuar a subir a taxa de juro de referência depois do esperado primeiro – e único – aumento no consulado de Mário Draghi. É esperado a subida umas semanas antes de Draghi deixar o BCE em outubro próximo.

Refere Wade que para além da UE ter perdido a oportunidade de normalização das taxas de juro, pode a região “ficar confinada a baixas taxas de juro e com pouco espaço de manobra para combater a próxima recessão”.

Qual o impacto nos mercados a nível de ações e obrigações?

Com os bancos centrais a oferecerem menos apoios aos mercados, estes parecem não ter descontado o suficiente perante os riscos de taxas de juro elevadas e de um grande endividamento das empresas. As oportunidades existem mas elas estão em indústrias disruptivas e que acrescentam valor. A transição das energias fósseis para as renováveis é uma dessas opções. Também a procura de outras energias alternativas suficientemente competitivas, e a aplicação à mobilidade, nomeadamente ao setor automóvel é uma das soluções.

Os bens de consumo e as tecnologias continuam a gerar forte interesse, sendo que são setores que têm de ser entendidos como disruptivos, pois se o retalho tradicional e alimentar está pressionado, existem oportunidades, salienta a Schroders. É o caso do consumo de conteúdos a nível de multimédia, sobretudo nas redes sociais, música e jogos. O BiG sustenta a nível de mercados acionistas que o setor da saúde tem um perfil defensivo, apesar da avaliação em alta a nível de PER que atingirá as 16,7 vezes em 2019. O setor das utilities tem o dividend yield mais atrativo, enquanto as desvalorizações acentuadas nos setores automóvel e bancário constituem outra oportunidade. O Credit Suisse acredita que as ações europeias irão recuperar e aposta nos setores de IT e cuidados de saúde.

Um dos maiores problemas a ter em atenção no mercado acionista estará ligado à logística, tanto relativamente às empresas que operam nesta atividade, como relativamente às empresas que dependem de fornecimentos onde a cadeia de abastecimento seja crítica. Recordam analistas que as empresas cuja cadeia de abastecimentos dependa fortemente da China podem ser confrontados com tarifas aduaneiras de 25% nas exportações para os EUA em 2019. Deslocalizar cadeias de abastecimento não é fácil e envolve custos elevados e isto significa que o dividend yield de empresas tradicionalmente líquidas pode ser irremediavelmente afetado.

Nas obrigações, onde estão as oportunidades?

Os ajustes na política monetária, primeiro da Fed, Banco de Inglaterra, Banco do Japão e, a prazo, do BCE, perturbaram a baixa volatilidade que se registou nesta classe de ativos desde 2008, o ano da queda do Lehman Brothers. Uma informação relevante para os investidores em obrigações a ter em conta será o nível de dívida de países e empresas. Quanto mais elevado, maior a vulnerabilidade. Os mercados de rendimento fixo estiveram tranquilos, com as taxas de juro a caírem para níveis sem precedentes e com o impacto dos estímulos de criação de grandes volumes de dinheiro. Acontece que o período acabou e a flexibilização quantitativa terminou. Em simultâneo registou-se um grande investimento anunciado pelo presidente dos EUA sob a forma de reduções fiscais, mas ao mesmo tempo um crescendo das tendências protecionistas, com a imposição de tarifas aduaneiras ao principal inimigo económico dos EUA, a China. As tréguas, entretanto anunciadas, apenas servem para reposicionar as estratégias.

Ora perante tudo isto os mercados financeiros estão a adaptar-se à mudança e os ativos de risco, como as ações e as obrigações sofrem, sobretudo porque é expetável uma forte possibilidade de incumprimentos de empresas, com estas a falharem o pagamento dos juros sobre obrigações. É por isso que países e empresas com elevados níveis de dívida são um perigo para os investidores em obrigações. A Schroders sugere que este será o fim das estratégias de: “Compra e manutenção, deter ações e obrigações e navegar nama trajetória ascendente suave. Antevemos grandes oportunidades para estratégias mais ativas, não só no rendimento fixo, como potencialmente em todas as classes de ativos”.

E o tema do Brexit?

Uma nota relevante sobre o impacto do Brexit no mercado acionista da responsabilidade do BIG refere que, desde o momento em que a saída começou a ser equacionada, as ações das empresas britânicas registaram uma performance inferior relativamente a outras praças financeiras. E tudo aconteceu, notam os analistas, num momento de pleno bull market acionista mundial, tendo o impacto atingido todo o tipo de companhias, independentemente da capitalização bolsista. Para o BIG há uma maior sensibilidade ao Brexit para as empresas que integram o índice FTSE 250, com empresas mais ligadas à economia do Reino Unido, com REIT expostos ao mercado imobiliário britânico, o setor financeiro, as companhias aéreas e empresas da indústria do turismo.

Mas pior do que o Brexit pode ser o fraco crescimento da Alemanha e a incerteza italiana, sustenta James Bateman, da Fidelity.

E Portugal? Sem avançar com recomendações, os analistas registam a pressão sobre os preços dos títulos financeiros, telecomunicações e retalho. O BiG fala de riscos e faz a síntese em quatro pontos: o nível de endividamento público e privado que é elevado; o índice de competitividade laboral que não acompanhou o crescimento do IDE e que impacta no crescimento futuro da economia; o eventual sobreaquecimento do mercado imobiliário que será perigoso perante um downturn global; e ainda o insuficiente ajustamento do setor público.

Artigo originalmente publicado na edição impressa de 28 de dezembro de 2018

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