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TGV poderá custar no mínimo seis mil milhões. “É um luxo para gente rica”, critica GEOTA

Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente mostra-se contra a construção da linha de alta velocidade entre Lisboa e Porto. “Não temos dimensão, população e estado económico que justifique ou que seja necessário ter uma alta velocidade”, afirma o engenheiro Eduardo Zúquete.
15 Janeiro 2024, 10h00

Está lançado o concurso para a linha de alta velocidade Lisboa – Porto e com ela surge o primeiro sinal de descontentamento para com o projeto do TGV que foi oficialmente apresentado na última sexta-feira pelo primeiro-ministro, António Costa. O Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente (GEOTA) mostra-se contra a construção da ligação entre as duas cidades, cujo trajeto será feito numa hora e quinze minutos, com paragens possíveis em Gaia, Aveiro, Coimbra e Leiria. Nesta primeira fase está o lançamento do concurso para o troço Porto – Oiã (Oliveira do Bairro, distrito de Aveiro).

Em declarações ao Jornal Económico (JE), os engenheiros Eduardo Zúquete e João Joanaz de Melo, dois dos membros do GEOTA, contestam a decisão tomada pelo Governo, considerando que a mesma não se justifica em Portugal e que os custos vão ser muito elevados, em comparação com o valor que seria necessária dispender para requalificar a atual ferrovia nacional.

“Quer-se impingir uma linha de alta velocidade porque os vizinhos [Espanha] também têm. Não precisamos de alta velocidade para nada, não temos dimensão, população e estado económico que justifique ou que seja necessário ter uma linha de alta velocidade. Precisamos de ter um bom comboio no serviço do dia a dia, na área metropolitana de Lisboa, onde o comboio faz imensa falta. Precisamos de ferrovia, mas não é esta ferrovia. Uma coisa é a alta velocidade interna, outra coisa é a alta velocidade”, refere Eduardo Zúquete.

O GEOTA tem vindo a preparar um documento no qual apresenta vários argumentos pelos quais devem ser reprovados a linha ferroviária de alta velocidade entre Porto e Lisboa, Fase 1/Lote B – Troço Soure-Aveiro (Oiã). Um deles passa pela questão financeira que entende o grupo ultrapassará provavelmente os seis mil milhões de euros impedindo assim outros investimentos em ferrovia, muito mais necessários. Além disso, defende o organismo, a linha de alta velocidade entre Lisboa e Porto dificilmente será viável (social, ecológica e economicamente), considerando que prioridade devia ser antes o reforço sistemático do serviço intercidades, essencial para a coesão territorial.

“Ninguém sabe, na verdade, quanto é que isto vai custar. Os números que encontramos variam entre os 4,5 mil milhões e os seis mil milhões de euros e nunca é clarificado, mas estamos a presumir que não inclui, por exemplo, as expropriações, não inclui medidas compensatórias e se não inclui a sinalização, mais grave ainda. Isto significa 20 milhões de euros por quilómetro em média no mínimo”, salienta João Joanaz de Melo, acrescentando que por outro lado, as obras de requalificação que têm sido feitas até agora, têm sido suficientes e onde os valores oscilam entre os dois e os cinco milhões de euros por quilómetro.

O engenheiro acredita mesmo que no final os números poderão ir muito mais além do que os seis mil milhões de euros desconhecendo-se também quem irá pagar o quê. “Já ouvi números não oficiais, de que isto poderá ir aos 10 mil milhões de euros. Das duas uma ou os preços dos bilhetes vão ser exorbitantes e não vai haver mercado ou os bilhetes serão baratos e é o contribuinte genérico que o vai pagar. Isto é um luxo para gente rica. Uma linha de alta velocidade é para competir com o avião não é para competir com automóvel. Isso é completamente ridículo”, sublinha João Joanaz de Melo.

Sobre a questão da poupança de tempo entre deslocações João Joanaz de Melo considera que com a atual linha ferroviária o trajeto Lisboa-Porto poderia ser feito em em duas horas ou duas horas e um quarto. “Isso seria muito competitivo, porque de facto o comboio dá um conforto muito melhor que o automóvel e em termos de tempo, para ser competitivo com o automóvel basta demorar duas horas”, explica, relembrando que Portugal tem há mais de duas décadas serviços em velocidade elevada (220 km/h), que se mostraram perfeitamente adequados a boa parte das necessidades nacionais e como tal o que está errado é o modelo de exploração incoerente e as baixas frequências.

Mais cáustico sobre este ponto é Eduardo Zúquete, que afirma ser importante “mobilar” e equipar melhor a linha ferroviária do Norte. “Basta não ter exigências de bolso e de tempo. Basta não estar a choramingar constantemente que levamos duas horas e meia para o Porto. A linha para o Porto está a funcionar. É uma questão de equipá-la com mais comboios. É uma questão de mobilar com mais comboios, saber mobilar a linha do Norte”, sublinha o engenheiro.

Durante a apresentação da linha de alta velocidade, António Costa lançou o desafio às empresas portuguesas a concorrerem ao projeto do TGV. “É importante que tenhamos as empresas portuguesas em condições de vencer os concursos até porque não há nenhum país que se modernize sem um forte tecido empresarial na área de construção civil e áreas públicas. Precisamos de empresas fortes nesta área por isso preparem-se”, destacou o primeiro-ministro.

Para o GEOTA, o facto do concurso por si só já estar lançado é um custo para o país, não tendo dúvidas de quem é que está a ganhar com toda esta situação. “Estão a ganhar as construtoras, as grandes construtoras nacionais e a banca. Isto é um problema, na verdade, de inteligência política, porque para as empresas construtoras nacionais, na nossa opinião, até seria mais interessante um programa a sério de requalificação da rede existente”, afirma João Joanaz de Melo.

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