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“A carga fiscal em Portugal é marcante”, defende Carlos Lobo

Fiscalista e ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais defende que a taxa fiscal de uma empresa “pode efetivamente duplicar e isso é algo inerente à nossa própria estrutura que explica muito o movimento ao nível dos outros impostos, taxas e contribuições especiais”.
25 Novembro 2020, 18h05

Carlos Lobo, ‘strategic advisor’ da EY defende que a “carga fiscal em Portugal é marcante” e recorda os dados de um estudo que a consultora fez para a Confederação Empresarial de Portugal (CIP): no Índice de Competitividade Fiscal desenvolvido pela Tax Foundation, Portugal situa-se em 34.º no ranking do imposto sobre o rendimento das empresas. Ou seja, é o terceiro país com maior taxa de imposto implícita sobre o rendimento das empresas (25%), sendo apenas ultrapassado por França (36,4%) e pela Eslováquia (29,3%).

“A carga fiscal em Portugal é marcante. Num estudo que fizemos para a CIP há cerca de um mês e meio, demostrou-se que a carga fiscal aplicada em Portugal é elevada. Utilizando os melhores rankings a nível mundial de 36 países na Europa, nós estamos em 34º”, afirmou Carlos Lobo, ‘strategic advisor’ da EY, na conferência JE/EY sobre o OE2021.

Para este fiscalista, e ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, esta posição “muito decorre de desajustamentos técnicos que estabelece uma carga fiscal que é superior à taxa nominal dos impostos. Nós temos, por exemplo, no IRC uma taxa nominal, mas a taxa efetiva pode ser muito superior com as tributações autónomas, limitações à dedutibilidade dos encargos financeiros”.

Para Carlos Lobo, “se nada for feito, a taxa fiscal de uma empresa pode efetivamente duplicar e isso é algo inerente à nossa própria estrutura e explica muito o movimento ao nível dos outros impostos, taxas e contribuições especiais. Porquê? Quando o legislador sente que está bloqueado ao nível dos outros impostos, tenta escapar para as outras figuras parcelares no sentido de atomizar essa tributação adicional que não entra nos compêndios da fiscalidade”.

Em causa estão mais de 4.300 taxas e contribuições que, em muitos casos, nem o próprio Estado sabe explicar porque é que as cobra, segundo o estudo da EY e da Sérvulo. Para Carlos Lobo, “as taxas e contribuições são um pouco causa e efeito de todo um padrão. A partir do momento que as taxas nominais dos impostos se encontram bloqueadas, porque efetivamente era inconcebível um aumento de impostos, as entidades públicas tendem a inclinar-se para outras figuras”.

Por outro lado, prossegue, existe outra situação como o Ministério das Finanças estar a reduzir as transferências paras os Serviços e Fundos Autónomos: “a forma que têm de se financiar é angariar receita própria por via do lançamento das próprias taxas. E depois há uma coisa que eu critico muito que é condenável em termos de ética publica que é a diabolização de determinados setores que são imunes à crise e por isso consideram que podem ser alvo de tributações agravadas como o setor energético, o farmacêutico, bancos – que não só têm a contribuição do serviço bancária como agora têm uma outra contribuição adicional de solidariedade sobre o setor”.

Carlos Lobo considera ainda que “houve um momento em que estas contribuições extraordinárias deviam ser desmanteladas, mas agora com esta crise duvido que possam desaparecer”.

“A nossa capacidade de reação à crise é menor”, diz ex-governante

Sobre as contribuições extraordinárias, o ex-governante ironiza que “não há nada mais permanente em Portugal do que um imposto extraordinário”, relembrando que o imposto do selo “foi criado em 1640 também era extraordinário e ainda está cá”.

De acordo com o fiscalista, faz a análise à proposta do OE2021, marcado por ausência de medidas de relevo para empresas: “não podemos esquecer que Portugal não tem recursos naturais, não tem riquezas. O Estado e as contas públicas estão altamente endividadas. Temos uma enorme dívida pública, por isso, a nossa capacidade de reação à crise é menor do que os nossos parceiros que têm outros meios. E também estamos num ponto que não é a fase da recuperação, mas de mitigação ou de contenção”.

Carlos Lobo considera, no entanto, que “o Governo está a aguardar alguma capacidade para utilizar no momento da recuperação, tendo agora utilizar outras formas de apoio como o lay-off”. E alerta: “mas isto gera mais despesa pública que vamos ter de pagar. E a questão é clara quem vai pagar são os portugueses e os cidadãos e as empresas que aplicam em Portugal”.

Este especialista refere ainda que “a bazuca dos fundos europeus está com tantas dificuldades em ser aprovada”. Realça aqui que “a questão não é só estar a demorar”, sinalizando dúvidas que “vá ser aplicada em Portugal na forma que poderia ser”. “Na prática tenho estado a ver uma tentativa do Estado em apropriar-se dos valores que vêm quando vemos quase dois mil milhões de euros para a modernização da administração pública”, explica, acrescentando que necessita de ver “o que isso quer dizer ao nível dos apoios à economia e aos efeitos na sua desburocratização”.

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