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Ricardo Mourinho Félix alerta para a evolução do crédito ao consumo

O secretário de Estado Adjunto e das Finanças diz que o aparecimento de fintech que facilitam a concessão de crédito deve ser acompanhada “por uma utilização responsável”. O governante referiu ainda que “sem uma avaliação de risco adequada, o aumento do crédito a particulares é uma visão de curto prazo”.
  • Cristina Bernardo
25 Setembro 2018, 11h34

“O crédito, em especial quando se fala em crédito ao consumo, tem de ser acompanhado de perto para evitar excessos”, disse hoje o Secretário de Estado Adjunto e das Finanças, Ricardo Mourinho Félix na conferência “Banca do Futuro”, do Jornal de Negócios, em Lisboa, que debruçou sobre como a era digital está a mudar o negócio bancário.

O secretário de Estado considera um risco os bancos estarem a apostar no crédito ao consumo. “Se o elevado nível de crédito malparado é ainda a marca da crise anterior, a que os bancos têm sabido dar resposta, é também essencial evitar uma nova acumulação de riscos”, disse.

Mourinho Félix realçou que o tema da supervisão de colocar limites à concessão de crédito, como medida macroprudencial, ganha importância com o aparecimento de novos agentes, como fintechs. Embora reconhecendo o papel importante destes novos players na concessão de crédito à economia, avisou que a facilidade de concessão de crédito deve ser acompanhada “por uma utilização responsável”.

“As regras sobre a atividade bancária devem acompanhar esta evolução  [aparecimento de novos agentes que facilitam a concessão de crédito]”.

“É fundamental a vigilância da evolução do crédito na nossa economia. O crédito a particulares, em especial o crédito ao consumo, deve ser seguido com muita atenção para evitar que seja impulsionado de forma imprudente, como aconteceu no passado”, referiu. Pois, “sem uma avaliação de risco adequada, o aumento do crédito a particulares é mais uma visão de curto prazo do que uma estratégia de futuro. Pode mesmo representar o desperdício de uma
oportunidade para reorientar o negócio bancário, pondo em causa o que foi conseguido pelos bancos e pelos seus acionistas”, alertou.

“Uma regulação eficaz é essencial para enfrentar estes desafios”, afirmou.

Sobre o tema da conferência o secretário de Estado defendeu “Não haja ilusões. Os próximos dez anos vão ser desafiantes para o negócio bancário e entusiasmantes para quem gosta de inovar”.

“Primeiro, a era digital vai abanar a banca tradicional. Cada vez mais os clientes vão preferir o canal online para comprar, pagar, investir ou fazer um crédito. Em segundo lugar, os bancos
saíram da sua zona de conforto. Saíram da atividade bancária tradicional, para procurarem maior rentabilidade para o seu negócio.  E em terceiro lugar, o crédito, em especial o crédito ao consumo, foi e continua a ser importante para um setor financeiro à procura de rentabilidade num ambiente de baixas taxas de juro. E, por isso, um segmento de negócio que tem de ser acompanhado de perto para evitar excessos”, disse o governante.

Mourinho Félix foi céptico em relação ao facto de a tecnologia e a era digital poderem ser portunidades para ganhos de eficiência no setor bancário. Concordou mas, diz, “não entro em euforia”. Pois “nem sempre grandes investimentos em tecnologia estão associados a correspondentes ganhos de eficiência. Muitos são apenas gastos. A era digital não vai resolver todos os problemas de rentabilidade dos bancos”, disse.

Isto admitindo que o setor financeiro está já há vários anos a sofrer um choque tecnológico, e que a banca atravessa uma fase de transição que pode mudar o negócio bancário para sempre.

“O futuro da banca é um negócio digital”, disse.

“Há uma tendência que parece ser consensual. Cada vez mais os clientes vão aceder a serviços financeiros no ecrã de um telemóvel ou de um tablet, acessíveis 24 horas por dia. A revisão da rede de balcões, trocada por terminais ATM ou canais eletrónicos, é um movimento natural e racional da banca” , disse admitindo que este movimento requer uma resposta dos reguladores e dos políticos, para que a literacia tecnológica – além da literacia financeira – não seja mais um fator de marginalização de segmentos da população no acesso a serviços bancários”, defendeu.

Aproveitando o tema, Mourinho Félix rapidamente apelou a que “os bancos devem continuar a prestar serviços com comissões acessíveis e com qualidade a segmentos da população que, por diversos motivos, não irão acompanhar a era digital”. Isto, “mesmo que isso implique uma pressão adicional sobre os gastos”.

“Esses clientes não podem ser marginalizados nem prejudicados na sua relação com os bancos”, disse.

Sobre o crescimento dos meios digitais lembrou que isso traduz “mais complexidade e maior volume dos pagamentos eletrónicos e, por isso, a necessidade de reforçar os padrões de segurança”, mas também “traz maior volume de informação e, por isso, é preciso uma preocupação acrescida com a proteção de dados pessoais”.

“A mudança que se tem observado justifica o alinhamento das regras europeias nesta matéria, em particular através da nova diretiva dos serviços de pagamento, conhecida como PSD 2. Esta diretiva permite que, pela primeira vez, sejam regulados determinados serviços de pagamento que recorrem a tecnologia e a canais não presenciais”, defendeu.

O governante defende que a diretiva da PSD 2 aumenta a concorrência entre os agentes do mercado. “E, por outro lado, abrem-se as portas à inovação tecnológica de uma forma transparente e segura para os consumidores e empresas”.

Estes novos serviços incluem a iniciação de pagamentos online através de uma aplicação, e ainda a agregação de informação financeira de cada cliente num único ecrã digital, mediante a sua autorização. A estes serviços surgem associadas soluções de aconselhamento financeiro personalizado, explicou.

“Para compreender o impacto do fenómeno das FinTech é necessário avaliar as vantagens e os riscos, e perceber como se relacionarão com os bancos incumbentes”, disse ainda. Pelo que “a Banca do Futuro” vai ser num futuro em que haverá menos banca, mas mais entidades tecnológicas e mais entidades financeiras. Um futuro em que os bancos vão deixar de assegurar todos os serviços e em que o tradicional princípio da exclusividade da atividade bancária vai ser desafiado e posto em causa.”

Posto isto, “é necessário encontrar e manter um equilíbrio entre por um lado, as vantagens da entre inovação, do progresso tecnológico e da concorrência, e, por outro lado, a gestão dos riscos associados, a proteção dos clientes, a segurança dos pagamentos e o tratamento dos dados pessoais”.

Ricardo Mourinho Félix defende que as regras sobre a atividade bancária devem acompanhar
essa mudança para o digital, “sem a prejudicar”, pois “é ineficiente cumprir regras que se tornaram obsoletas ou exigências burocráticas, sem sentido, que impõem custos de contexto. Temos o dever de questionar, identificar e eliminar essas regras”.

(atualizada)

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