[weglot_switcher]

Governo avança com lei que permite aos bancos contabilizar como custo fiscal novas imparidades

“A presente alteração visa sanar a divergência entre os sistemas contabilísticos e fiscais no que respeita ao tratamento de perdas por imparidades associadas a operações de crédito. Prevêem-se ainda regras disciplinadoras para as perdas por imparidade registadas nos períodos de tributação com início anterior a 1 de janeiro de 2019, e ainda não aceites fiscalmente”, diz o último comunicado do Conselho de Ministros
20 Janeiro 2019, 20h43

O Governo aprovou em Conselho de Ministros na passada quinta-feira  a proposta de lei que altera o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) em matéria de imparidades das instituições de crédito e outras instituições financeiras.

O Governo avança assim com o reconhecimento fiscal das imparidades, o que ajudará os bancos a pagar menos de IRC. A proposta prevê, para as novas imparidades constituídas que sejam consideradas como custo fiscal a 100%. O que é que isto quer dizer? Os bancos vão poder deduzir fiscalmente as imparidades que constituírem para crédito em risco e, assim, abater o imposto a pagar anualmente.

O jornal “Expresso” avança que a banca terá cinco anos para se adaptar ao novo regime de contabilização das imparidades como custos fiscal. Isto é, o Governo prevê um período de transição de cinco anos, segundo o semanário.

“A recente evolução da regulação bancária e das normas contabilísticas conduziu a um desfasamento entre a forma como as instituições de crédito e outras instituições financeiras reconhecem na sua contabilidade as perdas por imparidade associadas a operações de crédito e a forma como as mesmas são tratadas para efeitos fiscais”, lê-se no comunicado do Conselho de Ministros de 17 de janeiro.

A alteração que será levada ao Parlamento visa sanar a divergência entre os sistemas contabilísticos e fiscais no que respeita ao tratamento de perdas por imparidades associadas a operações de crédito.

Em 2017 esteve pensado dar tratamento fiscal diferenciado entre novas imparidades constituídas para casos concretos (créditos específicos), que seriam consideradas como custo fiscal a 100%, e as imparidades genéricas (constituídas com base em modelos estatísticos), que seriam consideradas como custo fiscal apenas a 75%. Esta proposta, segundo o Jornal Expresso deste fim de semana, acabou por não avançar e de forma mais simplista, passa a contabilizar-se (assim que entrar em vigor a legislação) a 100% as novas imparidades para crédito como custo fiscal, aproximando a fiscalidade da contabilidade. Uma medida que já tinha sido defendida na reforma fiscal de 2013, liderada por António Lobo Xavier.

Isto é uma novidade, porque,  agora, as imparidades não têm um reconhecimento fiscal directo. Pois o fisco só aceita como custo os prejuízos efectivos e não os prejuízos eventuais (que é o que significam as imparidades).

Num artigo do Jornal Económico, datado de 21 de abril de 2017, António Lobo Xavier explicava que, “em regra”, defende que “a fiscalidade se deve aproximar da contabilidade. Salvo em casos limite ou de abuso”. “Se um certo decaimento – imparidade, custo, etc – afetar o resultado contabilístico, então deve afectar também o resultado fiscal”, defende o fiscalista. “No passado, o IRC aceitava a dedução fiscal das provisões impostas pelo Banco de Portugal, mas depois a lei foi impondo sucessivos limites, e, no caso dos bancos, a fiscalidade foi-se afastando muito da contabilidade. Na Reforma de 2013, tentei restaurar o princípio, mas não consegui ir tão longe quanto queria”, explica Lobo Xavier. “Assim, esta medida anunciada visa isso mesmo: o resultado fiscal deve acolher as imposições regulatórias, não se trata de nenhum frete ou benefício, trata-se de justiça e de boa técnica fiscal”, dizia o jurista.

A notícia fora na altura confirmada no Programa Nacional de Reformas, no capítulo referente ao sistema bancário para 2017. “O Governo apresentará à Assembleia da República, até maio, uma proposta de lei de revisão do artigo 28.º – C do Código do Imposto do Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) no sentido de consagrar um regime de reconhecimento fiscal das imparidades que, fora das situações de relações especiais ou de cobertura por garantia, admita esse reconhecimento nos termos em que essas imparidades devem ser registadas por imposição das normas contabilísticas determinadas pela supervisão”, dizia o texto. “Reveste-se de enorme importância que o registo de imparidades dos créditos se adeque ao regime contabilístico e prudencial”, defendia o Ministério das Finanças.

O objectivo, segundo o Governo, é “evitar a criação de novos ativos por impostos diferidos [que acabaram em janeiro de 2016] e refletir fiscalmente a situação real das imparidades do setor financeiro português”.

Apesar de estar na agenda do Governo desde 2017 só agora foi aprovado em Conselho de Ministros.

O reconhecimento das imparidades que põe o resultado líquido mais próximo do resultado para efeitos fiscais (o fisco retira dos lucros/prejuízos dos bancos os custos que não são considerados fiscalmente) só se aplica quando a nova lei entrar em vigor.

Para o stock de imparidades aplica-se a regra de poder deduzir fiscalmente durante 15 anos as imparidades que ainda não foram deduzidas em IRC, até ao limite de  70%.

Mas “prevêem-se ainda regras disciplinadoras para as perdas por imparidade registadas nos períodos de tributação com início anterior a 1 de janeiro de 2019, e ainda não aceites fiscalmente”, diz ainda o comunicado do Conselho de Ministros sem detalhar.

Na lista de medidas do governo para a banca sempre esteve a estabilização do regime legal associado aos ativos por impostos diferidos e a clarificação do entendimento da Autoridade Tributária relativamente ao tratamento fiscal do desreconhecimento de créditos de balanço (write-offs).

Recorde-se que em novembro de 2017 a bancada parlamentar do PS retirou da votação uma proposta de alteração que tinha submetido para permitir a dedução dos impostos diferidos acumulados pelos bancos nos anos seguintes.

O secretário de Estado Adjunto e das Finanças, Ricardo Mourinho Félix, disse na altura que o objetivo da alteração dos impostos diferidos é “introduzir disciplina”, defendendo que isso trará previsibilidade à receita fiscal nos próximos anos.

“O que estamos a introduzir é um regime que disciplina o regime dos DTA [activos por impostos diferidos elegíveis] que são hoje cerca de 5.000 milhões de euros que podem ser usados em qualquer um dos próximos anos e que afetarão a previsibilidade da receita fiscal de muitos orçamentos nos próximos anos”, afirmou em 2017 Mourinho Félix.

Recorde-se que o PS apresentou no passado uma proposta de alteração ao Orçamento do Estado para 2018 (OE2018) que criava uma norma transitória para os impostos diferidos que os bancos acumularam, permitidos que estes sejam deduzidos aos impostos a pagar ao fisco (quando os bancos têm lucros) ao longo dos anos seguintes. Mas que acabou por não avançar.

Os créditos fiscais são criados pela diferença entre os custos contabilísticos assumidos pelos bancos — nomeadamente por provisões (para perdas potenciais) para créditos em incumprimento – e o reconhecimento para efeitos fiscais. Como o fisco aceita menos deduções fiscais do que as contabilizadas por provisões para crédito, criam-se ativos por impostos diferidos.

Ao criar uma norma transitória  é dada uma garantia de Estado de que esses ativos por impostos diferidos serão aceites e, assim, evitado que os bancos tenham de os deduzir ao capital, o que seria um ‘rombo’ para os fundos próprios dos bancos.

Segundo o Expresso deste sábado, quem avançar para o regime transitório durante cinco anos terá de criar um dossier fiscal com a identificação das imparidades que estão sujeitas ao regime antigo e as imparidades que estão abrangidas pelo novo regime de dedução fiscal a 100%. O que vai implicar um reforço no reporte dos créditos com imparidades.

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.