Muito antes do recente crescimento do turismo em Portugal, estrangeiros de diversas proveniências vieram de viagem ao nosso país e escreveram as suas impressões. “O Olhar do Outro – Estrangeiros em Portugal do Século XVIII ao Século XX”, de Maria Filomena Mónica e recentemente publicado pela Relógio d’Água, tendo merecido já uma primeira reimpressão, junta diversos desses relatos.
Divididos em quatro capítulos – O Terramoto e o Antigo Regime (1755-1820), Tempos Agitados (1820-1851), A Regeneração (1851-1910) e O Século XX –, neles encontramos nomes mais ou menos (re)conhecidos por cá. Dos iniciais, o mais sonante será o de William Beckford, nascido numa das mais ricas famílias inglesas da época. Quando se dirigia à Jamaica, sofrendo de tal enjoo no barco, pede ao comandante que encurte a viagem e fica por Lisboa, com os seus 30 criados, um médico e um piano. Voltaria mais umas três vezes, tendo comprado a Quinta de Monserrate.
E, claro, Lord Byron, que não terá gostado particularmente do que viu – em particular os habitantes –, com exceção de Sintra, sobre a qual escreveria ser “talvez a mais bela do mundo”, Hans Christian Andersen ou Mark Twain, cujo retrato dos Açores, onde pararia a caminho da Terra Santa, é de tal forma pouco elogioso que quase impedia a publicação de “A Viagem dos Inocentes” em português. Mas a verdade é que Twain troçava de tudo e de todos, pelo que os habitantes do Faial, onde o barco atracou, não foram exceção.
Igualmente implacável foi Simone de Beauvoir, ao contrário de Sybille Bedford (lamentavelmente nunca traduzida para português), que achava que os portugueses trabalhavam muito e por muitas horas, a troco de salários miseráveis. O autor de “O Principezinho”, Antoine de Saint-Exupéry, também por cá esteve, em 1940, a caminho dos Estados Unidos, no mesmo ano que o húngaro Arthur Koestler, como tantos outros refugiados judeus. O antissemita romeno Mircea Eliade deixou um diário da sua estadia de 1941 a 1945, quando aqui ocupou o cargo de adido cultural do seu país.
Logo em 1974, destaque para o poeta alemão Hans Magnus Enzensberger, hoje com 90 anos, que, na sua segunda vinda a Portugal, em 1986, considerava que o sonho de 1974 morrera, mas que não perdêramos todas as nossas qualidades: continuávamos patologicamente tolerantes, céticos e espontaneamente generosos.
Já Gabriel Garcia Márquez, em Lisboa para escrever uma reportagem sobre o Portugal pós-Revolução (esteve duas semanas em junho de 1975), encantou-se com o arroz de cabidela, assistiu à tomada de posse dos primeiros deputados democraticamente eleitos e considerou que os portugueses eram intrépidos na condução, não respeitando os semáforos, tendo atribuído esta característica ao facto de, na altura, nos sentirmos felizes e livres.
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